TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012

312 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL do seu âmbito de aplicação os candidatos que, concluindo o curso de ensino secundário num país estrangeiro no ano letivo imediatamente anterior àquele para que requerem inscrição e matrícula, onde residiram por mais de dois por se encontrarem a acompanhar um familiar em missão oficial, à data de apresentação daquele requerimento já haviam voltado a residir em Portugal, por a comissão ter cessado. 4. Sustenta a recorrente que a exigência de que a deslocação do familiar em missão e a residência no estrangeiro do candidato perdurem à data da formulação do requerimento de inscrição e matrícula constitui uma exigência arbitrária, sem conexão material com a razão de ser da concessão deste regime especial e, por via disso, conducente a que estudantes na mesma situação quanto ao período de frequência e conclusão do ensino secundário no estrangeiro, e quanto à inerente impossibilidade ou dificuldade de realização dos exa- mes de ensino secundário e provas de ingresso em Portugal para se candidatarem pelo regime geral, vejam a sua pretensão ser objeto de tratamento de sentido oposto em função de um fator sem relação material com a razão que justifica a concessão de tal regime especial de acesso ao ensino superior. Haveria na norma assim interpretada a violação do princípio da igualdade – do princípio geral da igualdade previsto no n.º 1 do arti- go 13.º e do princípio da igualdade de acesso ao ensino superior previsto no n.º 1 do artigo 76.º da Consti- tuição – por conduzir a uma diferenciação de tratamento arbitrária de pessoas na mesma situação relevante. Vale por dizer que solução normativa considerada violaria o princípio da igualdade enquanto proibição do arbítrio, sendo esta a dimensão do princípio que importa considerar. Em traços gerais, sobre o entendimento do Tribunal acerca desta vertente do princípio da igualdade, mantém-se válidas as seguintes considerações do Acórdão n.º 232/03 (disponível, como a demais jurispru- dência citada, em www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/). «Assente a possibilidade de estabelecimento de diferenciações, tornar-se-á depois necessário proceder ao con- trolo das normas sub judicio , feito a partir do fim que visam alcançar, à luz do princípio da proibição do arbítrio (Willkürverbot) e, bem assim, de um critério de razoabilidade. Com efeito, é a partir da descoberta da ratio da disposição em causa que se poderá avaliar se a mesma possui uma “fundamentação razoável” (vernünftiger Grund) , tal como sustentou o “inventor” do princípio da proibição do arbítrio, Gerhard Leibholz (cfr. F. Alves Correia, O plano urbanístico e o princípio da igualdade, Coimbra, 1989, pp. 419 e segs). Essa ideia é reiterada entre nós por Maria da Glória Ferreira Pinto: “[E]stando em causa (...) um determinado tratamento jurídico de situações, o critério que irá presidir à qualificação de tais situações como iguais ou desiguais é determinado diretamente pela ratio do tratamento jurídico que se lhes pretende dar, isto é, é funcionalizado pelo fim a atingir com o referido tratamento jurídico. A ratio do tratamento jurídico é, pois, o ponto de referência último da valoração e da escolha do critério” (cfr. Princípio da igualdade: fórmula vazia ou fórmula ‘carregada’ de sentido?, in Separata do Boletim do Ministério da Justiça , n.º 358, Lisboa, 1987, p. 27). E, mais adiante, opina a mesma Autora: “[O] critério valora- tivo que permite o juízo de qualificação da igualdade está, assim, por força da estrutura do princípio da igualdade, indissoluvelmente ligado à ratio do tratamento jurídico que o determinou. Isto não quer, contudo, dizer que a ratio do tratamento jurídico exija que seja este critério, o critério concreto a adotar, e não aquele outro, para efeitos de qualificação da igualdade. O que, no fundo, exige é uma conexão entre o critério adotado e a ratio do tratamento jurídico. Assim, se se pretender criar uma isenção ao imposto profissional, haverá obediência ao princípio da igualdade se o critério de determinação das situações que vão ficar isentas consistir na escolha de um conjunto de profissionais que se encontram menosprezados no contexto social, bem como haverá obediência ao princípio se o critério consistir na escolha de um rendimento mínimo, considerado indispensável à subsistência familiar numa determinada sociedade” ( ob. cit., pp. 31-32). Também a jurisprudência constitucional se orienta nesse sentido. Assim, o Tribunal Constitucional alemão já teve ensejo de afirmar que “(...) um tratamento arbitrário é aquele que (...) não é compreensível por uma apreciação razoável das ideias dominantes da Lei Fundamental” (42 BVerfGE 64, 74) e que “[A] máxima da igualdade é vio- lada quando para a diferenciação legal ou para o tratamento legal igual não é possível encontrar um motivo razoá- vel, que surja da natureza das coisas ou que, de alguma outra forma, seja compreensível em concreto, isto é, quando

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