TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012

31 acórdão n.º 404/12 n.º 2, do Estatuto do Provedor de Justiça não representa uma livre criação legislativa, mas uma vinculada concretização de parâmetros constitucionais. Nem se diga, em contrário, que, desta forma, o direito de queixa pode servir para o exercício sub-rep- tício daqueles outros direitos que o artigo 270.º da CRP admite especificamente poderem ser restringidos aos militares e, com isto, esvaziar de sentido o preceituado neste artigo, comprometendo os objetivos que o legislador constituinte aí pretendeu prosseguir (genericamente, como se disse, impedir ações de organização ou exercício coletivos e assegurar a isenção política dos militares, “ideia inspiradora do Estado de direito democrático” – cfr. Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , ob. cit ., p. 627). Não é pelas hipóteses anómalas de exercício abusivo ou de desvirtuamento funcional que se deve medir a justeza ou a conformidade constitucional de uma garantia. Compete antes ao Provedor de Justiça, utilizan- do os seus poderes de apreciação preliminar das queixas (artigo 27.º do respetivo Estatuto), não admitir as que possam canalizar protestos ou contestações coletivas. Em face do exposto, é de concluir que a norma do artigo 34.º, n.º 1, da Lei de Defesa Nacional, na parte em que prescreve que as queixas dos militares ao Provedor de Justiça têm por objeto “ações ou omissões dos poderes públicos responsáveis pelas Forças Armadas de que resulte violação dos seus direitos, liberdades e garantias”, representa uma restrição inconstitucional do direito de queixa consagrado no artigo 23.º da Constituição da República. III – Decisão Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide: a) Não declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos artigos 34.º, n.º 1, da Lei Orgânica n.º 1-B/2009, de 7 de julho, e do artigo 2.º, n.º 1, da Lei n.º 19/95, de 13 de julho, no segmento em que impõem a prévia exaustão das vias hierárquicas previstas na lei para a apresentação de queixa ao Provedor de Justiça por parte dos militares ou agentes militarizados. b) Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, por violação do artigo 23.º da Cons- tituição, da norma constante do artigo 34.º, n.º 1, da Lei Orgânica n.º 1-B/2009, de 7 de julho, na parte em que limita a possibilidade de apresentação de queixas ao Provedor de Justiça por motivo de ações ou omissões das Forças Armadas aos casos em que ocorra violação dos direitos, liberdades e garantias dos próprios militares queixosos. Lisboa, 18 de setembro de 2012. – Joaquim de Sousa Ribeiro – Vítor Gomes – Maria Lúcia Amaral – José da Cunha Barbosa – Maria João Antunes – João Cura Mariano – Ana Guerra Martins – Catarina Sarmento e Castro [vencida, quanto à alínea a) , nos termos e pelas razões expostas na declaração de voto junta] – Carlos Fernandes Cadilha (vencido nos termos da declaração em anexo) – Rui Manuel Moura Ramos. DECLARAÇÃO DE VOTO Divergi da maioria relativamente à decisão da alínea a) , na medida em que não se declarou a inconstitu- cionalidade das normas constantes do artigo 34.º, n.º 1, da Lei Orgânica n.º 1-B/2009, de 7 de julho, e do artigo 2.º, n.º 1, da Lei n.º 19/95, de 13 de julho, no segmento em que impõem a prévia exaustão das vias hierárquicas previstas na lei para a apresentação de queixa ao Provedor de Justiça por parte dos militares ou agentes militarizados. Faço-o pela seguinte ordem de razões: A primeira respeita ao entendimento do disposto no artigo 23.º da Constituição, quando atribui aos cidadãos em geral o direito fundamental de apresentação de queixa ao Provedor de Justiça, e estabelece, no

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