TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012

279 acórdão n.º 591/12 finais, proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal coletivo, que apliquem pena de prisão superior a cinco anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito. Não sendo interposto de decisão do tribunal coletivo, ou sendo recurso de decisão do tribunal coletivo ou do tribunal do júri que não aplique pena de prisão superior a cinco anos, o recurso, mesmo versando exclusivamente o reexame da matéria de direito, segue a regra geral do artigo 427.º do CPP e deve ser obrigatoriamente dirigido ao Tribunal da Relação. A repartição das competências em razão da hierarquia pelas instâncias de recurso está, assim, delimitada por uma regra-base que parte da confluência de uma dupla de pressupostos – a natureza e a categoria do tribunal a quo e a gravidade da pena efetivamente aplicada. A coerência interna do regime de recursos para o STJ em matéria penal supõe, deste modo, que uma decisão em que se não verifique a referida dupla de pressupostos não deva ser (não possa ser) recorrível para o STJ. Com efeito, se não é admissível recurso direto de decisão proferida por tribunal singular, ou que aplique pena de prisão não superior a cinco anos, também por integridade da coerência que deriva do princípio da paridade ou até da maioria de razão, não poderá ser admissível recurso de segundo grau de decisão da Relação que conheça de recurso interposto nos casos de decisão do tribunal singular ou do tribunal coletivo ou do júri que aplique pena de prisão não superior a cinco anos. Como a propósito se refere em acórdão do STJ (de 25 de junho de 2008, proc. 1879/2008), “desde que não haja condenação em pena não superior a cinco anos de prisão, não incumbe ao STJ, por não se circunscrever no âmbito dos seus poderes de cognição, apreciar e julgar recurso interposto de decisão final do tribunal coletivo o do júri, que condene em pena não superior a cinco anos de prisão” “o legislador, ao arredar da competência do Supremo o julgamento do recurso de acórdãos proferidos, em recurso, pelas Relações, que apliquem pena não privativa de liberdade, quis implicitamente significar, de harmonia com o artigo 9.º do Código Civil, na teleologia e unidade do sistema quanto a penas privativas de liberdade, que […] apenas é admissível recurso de acórdão da Relação para o Supremo quando a Relação julgar recurso de decisão do tribunal coletivo ou do júri, em que estes tivessem aplicado pena superior a cinco anos de prisão”. É, pois, neste círculo hermenêutico que têm de ser interpretadas as normas do artigo 400.º, n.º 1 do CPP, quando determinam a irrecorribilidade (e, por antonímia, a recorribilidade) das decisões proferidas, em recurso, pelo tribunal da relação. Desde logo a norma da alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º, que prevê a irrecorribilidade das decisões proferidas em recurso pela Relação, que apliquem pena não privativa de liberdade. A formulação da norma constava da Proposta de Lei n.º l09/X ( Diário da República II série, n.º 31, de 23 de dezembro de 2006) em termos diversos (“são irrecorríveis” os acórdãos proferidos, em recurso, pela Relação, “que apliquem pena de multa ou pena de prisão não superior a cinco anos”), adaptando, por comparação com a anterior formulação e para os casos aí previstos, o critério da “pena aplicada” em lugar da “pena aplicável ao crime” (Os Projetos de Lei n.º 237/X, Diário da República II série. n.º 100, de 6 de abril de 2006; 368/X, 369/X e 370/X, Diário da República , II série, n.º 52, de 9 de março de 2007 não previam qualquer alteração para a alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º). A redação final foi votada, após proposta oral do PS (com a abstenção dos restantes Partidos), em última leitura no Grupo de Trabalho da Comissão Parlamentar, ficando a expressão constante da redação fixada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto – “que apliquem pena não privativa de liberdade”. O Relatório dos trabalhos preparatórios, de 18 de julho de 2007, fixando a alteração na sequência da “proposta oral”, não deixa qualquer traço de fundamentação que justifique o desvio em relação ao primeiro texto proposto e a consequente “descontinuidade metodológica”. E, assim, também não deixa massa crítica nos procedimentos que permita obter deduções, com o peso de probabilidade necessário, sobre a vontade ou a intenção de legislador. Isto é, não parece possível determinar se a formulação final e votada da norma constitui um “acidente” na metodologia da formação normativa, ou uma expressão concreta, firme e pensada da vontade do legislador.

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