TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
209 acórdão n.º 530/12 4. Por outro lado, e ainda no que concerne às penas acessórias, distinguem-se assim dos chamados efeitos das penas, onde se trata de consequências – necessárias ou pendentes de apreciação judicial – determinadas pela aplica- ção de uma pena, principal ou acessória, que não assumem a natureza de verdadeiras penas por lhes faltar o sentido, a justificação, as fina1idades e os limites próprios daquelas. 5. Os requisitos para a aplicação das penas acessórias em gera1 são os seguintes: 1.º A condenação do agente numa pena concreta superior a dois anos; e 2.º Que a violação justificativa tenha de ser vista não apenas do lado do crime cometido – esse sancionado com a pena principal – mas também à luz do reflexo que este crime produz sobre a função que o agente exerce, por último, assinale-se que o nosso Código Penal regula como penas acessórias tão somente a demissão da função pública, a suspensão temporária da função pública e a interdição do exercício de profissões, atividades ou direitos. 6. No entanto, isso não significa que, através de leis extravagantes, o direito não possa criar outras formas de penas; no caso concreto (a inibição para o exercício de profissão ou a ocupação de cargos), o que se encontra radi- calmente contra os direitos liberdades e garantias assegurados na Constituição da República Portuguesa é a forma díspar com que a pessoa (neste caso o inibido) é tratado no processo penal e no CIRE. 7. As garantias do processo penal não só não são respeitadas na aplicação do artigo 189.º n.º 2 alínea c) do CIRE como se inverte o ónus da prova. 8. A aplicação da presunção tem consequências absolutamente nefastas na vida das pessoas, não sendo atendi- das as circunstâncias concretas e de facto que motivaram o inibido, não são tidas em atenção a idade e as condições sócio-económicas do inibido, omissão que pode ser absolutamente castradora do seu futuro. 9. O reconhecimento constitucional da capacidade civil, como decorrência imediata da personalidade e da subjetividade jurídicas, cobre tanto a capacidade de gozo como a capacidade de exercício ou de agir. 10. É certo que, contrariamente à personalidade jurídica, a capacidade, em qualquer das suas variantes, é algo de quantificável, uma posse suscetível de gradações, de detenção em maior ou menor medida mas a sua privação ou restrição, quando afete sujeitos que atingiram a maioridade, era sempre uma medida de caráter excecional só justificada, pelo menos em primeira linha, pela proteção da personalidade do inibido. 11. Esta inibição, que parece ter como motivação a proteção dos futuros credores da insolvente e do tráfego jurídico-económico, é de constitucionalidade altamente duvidosa, porquanto não são respeitados os direitos fun- damentais, pois, a mera alegação de que não cumpriu com uma determinada obrigação (no caso concreto das enumeradas no artigo 186.º do CIRE) não deve ser suficiente para declarar um gerente inibido; deverá ser sempre necessário o nexo de causalidade adequada entre a atuação presumida naquele normativo e a situação de insolvên- cia com as garantias do Processo Penal sob pena de violação da presunção de inocência consagrada na Constituição da República Portuguesa (artigos 18.º e 26.º): «Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são diretamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas. A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salva- guardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. As leis restritivas de direitos, liber- dades e garantias têm de revestir caráter geral e abstrato e não podem ter efeito retroativo nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação. A lei estabelecerá garantias efetivas contra a obtenção e utiliza- ção abusivas, ou contrárias à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias. A privação da cidadania e as restrições à capacidade civil só podem efetuar-se nos casos e termos previstos na lei, não podendo ter como fundamento motivos políticos.» in Constituição da República Portuguesa. 12. O Estado de direito é enformado e conformado por princípios radicados na consciência jurídica geral e dotados de valor ou bondade intrínsecos, não basta, para estarmos sob o império do direito, que o Estado observe
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=