TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
202 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Não há dúvida que o legislador é livre na conformação da lei, tendo em conta as situações que com ela pre- tende regular e os resultados que pretende alcançar; porém, não poderá nunca olvidar, no exercício da sua função legislativa, os princípios constantes da Constituição, enquanto parâmetros validadores da eficácia daquela função. Daí que, ainda que a questão se coloque com um enfoque diverso do que se colocava anteriormente à redação ora resultante do Decreto-Lei n.º 226/2008, de 20 de novembro, se afigure que a solução a dar à questão de (in) constitucionalidade suscitada, tendo em conta o princípio da tutela judicial e efetiva, não possa ser diversa da que foi encontrada nos Acórdãos n. os 658/06 e 283/11 deste Tribunal, cuja doutrina, no essencial e decisivo, é aplicável no caso sub judice . Ora, no Acórdão n.º 658/06, publicado no Diário da República , II Série, de 9 de janeiro, perante uma idêntica situação de limitação dos fundamentos de oposição à execução, cujo título executivo era uma ‘injunção a que havia sido oposta fórmula executória’, tão só aos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do exequente, afirmou-se o seguinte: (…) “ (…) a característica deste título judicial impróprio, que o afasta dos restantes títulos criados por força de disposição legal, resulta, aliás, do facto de a força executiva ser conferida apenas depois de se conceder ao devedor a possibilidade de, judicialmente, discutir a causa debendi, alegada. Ou seja, no processo de injunção, o requerido tem a possibilidade de, deduzindo oposição, impedir que seja aposta força executiva à ação”. Pode talvez dizer-se que o título executivo não é uma sentença porque o devedor optou por, no pro- cedimento de injunção, não se opor à pretensão do requerente. Mas, seja como for, a falta de oposição e a consequente aposição de fórmula executória ao requerimento de injunção não têm o condão de transfor- mar a natureza (não sentencial) do título, tornando desnecessária, em sede de oposição à execução, a prova do direito invocado, deixando ao executado apenas a alegação e prova de factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do exequente. Tendo presente, por um lado, que a demonstração do direito do exequente não tem o mesmo grau de certeza relativamente a todos os títulos executivos, reconhecendo-se que o título executivo que resulte da aposição da fórmula executória a um requerimento de injunção demonstra a aparência do direito subs- tancial do exequente, mas não uma sua existência considerada certa, e, por outro lado, que a atividade do secretário judicial não representa qualquer forma de composição de litígio ou de definição dos direitos de determinado credor de obrigação pecuniária, há que evitar a “indefesa” do executado, entendendo-se por “indefesa” a privação ou limitação do direito de defesa do executado que se opõe à execução perante os órgãos judiciais, junto dos quais se discutem questões que lhe dizem respeito. Nos termos do artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, se uma limitação interfere com um direito, restrin- gindo-o, necessário se torna encontrar na própria Constituição fundamentação para a limitação do direito em causa como que esta se limite “ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucio- nalmente protegidos” – não podendo, por outro lado, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, “diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais”. No caso, a possibilidade de se introduzir limites ao princípio da proibição de “indefesa”, ínsito na garantia de acesso ao direito e aos tribunais, consagrada no artigo 20.º da Constituição, existe apenas na medida necessária à salvaguarda do interesse geral de permitir ao credor de obrigação pecuniária a obtenção, ‘de forma célere e sim- plificada’, de um título executivo” (9.º § do preâmbulo do Decreto‑Lei n.º 269/98, de 1 de setembro), assim se alcançando o justo equilíbrio entre esse interesse e o interesse do executado de, em sede de oposição à execução, se defender através dos mecanismos previstos na parte final do n.º 1 do artigo 815.º do Código de Processo Civil (correspondente hoje ao artigo 816.º, na redação introduzida pelo Decreto‑Lei n.º 38/2003, de 8 de março). Ora a norma em causa, na interpretação perfilhada dos autos, segundo a qual a não oposição e a consequente aposição de fórmula executória ao requerimento de injunção determinam a não aplicação do regime da oposição à execução previsto nos artigos 813.º e segs. do Código de Processo Civil, designadamente o afastamento da oportu- nidade de, nos termos do atual artigo 816.º do mesmo Código, e (pela primeira vez) perante um juiz, o executado
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