TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012

196 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O sistema judicial não é unitário, prevendo a Constituição (CRP) diversas categorias ou ordens autó- nomas de tribunais, com estruturas separadas (artigo 209.º da CRP). Designadamente, para o que agora interessa, com a revisão constitucional de 1989, os tribunais administrativos e fiscais deixaram de ser de exis- tência formalmente facultativa, para passarem a integrar uma categoria ou ordem jurisdicional com estatuto constitucionalmente autónomo (artig os 209.º e 212.º da CRP). A esta dualidade de ordens jurisdicionais corresponde a autonomia do respetivo “corpo de juízes”, cada um com um órgão próprio de governo com competência para proceder à nomeação, colocação, transferên- cia, promoção e exercício da ação disciplinar relativamente aos juízes que o integram (artigo 217.º da CRP). Na pluralidade de ordens jurisdicionais está pressuposta a autonomia e separação das respetivas magistratu- ras, embora não seja constitucionalmente proibida a intercomunicação entre elas quanto ao provimento dos respetivos quadros. Da unicidade de corpo e de estatuto que a Constituição estabelece para a magistratura dos tribunais judiciais (artigo 215.º, n.º 1, da CRP) podem retirar-se consequências quanto ao posiciona- mento dos seus juízes no seio da respetiva magistratura, mas não quanto à conservação da antiguidade que aí detenham para efeitos de posicionamento relativo em magistratura diversa a que legalmente tenham acesso. Os juízes dos tribunais judiciais formam um “corpo único” entre si, não com os demais magistrados ou juí- zes dos restantes tribunais. A carreira que a Constituição garante aos juízes dos tribunais judiciais é a que se desenvolve em dois escalões de acordo com a hierarquia dos tribunais judiciais (cfr. n.º 3 do artigo 215.º da CRP). Nada se retira do capítulo da Constituição relativo ao estatuto dos juízes que obste a que os magis- trados que, a qualquer título de provimento, optem por transitar para outra magistratura fiquem sujeitos às regras de posicionamento relativo que rejam a categoria em que ingressam. A recorrente não contesta propriamente esta autonomia organizativa e estatutária da magistratura dos tribunais administrativos e fiscais. O que censura é a violação de princípios gerais, designadamente dos “princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição, da proteção da confiança, ínsito na ideia de Estado de direito democrático consignada no artigo 2.º da Constituição, conjugado com o princípio da proporcionalidade, consagrado de forma explícita a propósito dos direitos, liberdades e garantias, no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, e da justiça, ínsito na ideia de Estado de direito democrático consignada no artigo 2.º da Constituição”, pelo facto de a antiguidade dos juízes recrutados ao abrigo do artigo 7.º da Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, verem a antiguidade como juízes dos tribunais administrativos e fiscais re- portada à data da sua nomeação como juízes estagiários, enquanto o tempo de serviço anterior dos juízes dos tribunais comuns que acediam diretamente por via de concurso, o que dispensava desse estágio específico, não é considerado para o mesmo efeito. Ora, o que se disse quanto à consagração constitucional da autonomia das jurisdições e da separação das magistraturas é suficiente para que se conclua pela manifesta falta de fundamento da alegada infração aos princípios da proteção da confiança e da proporcionalidade. Nenhuma expectativa fundada em dados normativos do sistema vigente de organização dos tribunais e do estatuto dos juízes poderia ter a recorrente em ver-se posicionada nas listas de antiguidade dos tribunais administrativos e fiscais segundo o seu tempo de serviço anterior na magistratura de origem. Um tempo mínimo de serviço era condição de acesso por essa via de recrutamento por concurso curricular (em vez do curso de formação teórico-prática no Centro de Estudos Judiciários (CEJ), seguida de estágio na jurisdição) e a antiguidade na magistratura de origem poderia influir no resultado do concurso. Mas nesse efeito de requisito de ingresso e fator de graduação se esgotava, não se vislumbrando com que fonte normativa poderia um juiz na situação da recorrente reivindi- car um investimento na confiança, no momento em que concorreu e aceitou a nomeação, de que viria a ser posicionado na lista de antiguidade em função desse tempo de serviço anterior. E também não há violação do princípio da igualdade. Conforme tem sido frequentemente afirmado, não cabe ao Tribunal Constitucional substituir-se ao legislador na avaliação da razoabilidade das medidas legislativas, formulando sobre elas um juízo positivo,

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