TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012

174 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL princípio ínsito nos números anteriores a privação de liberdade, pelo tempo e nas condições que a lei deter- minar no caso de: «c) Prisão, detenção ou outra medida coativa sujeita a controlo judicial, de pessoa que tenha penetrado ou per- maneça irregularmente no território nacional ou contra a qual esteja em curso processo de extradição ou de expulsão». Tal não é, manifestamente, o caso dos autos, pelo que não se vislumbra em que medida o n.º 2 do artigo 194.º poderá envolver violação da alínea c) do n.º 2 do artigo 27.º da CRP. Ainda que se entenda que a invocação pelo juiz do tribunal a quo do n.º 3 do artigo 27.º da CRP se refira, por lapso, à alínea c) em vez de se referir à alínea b) – « b) Detenção ou prisão preventiva por fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a três anos» – não se vislumbra em que medida o n.º 2 do artigo 194.º possa envolver violação da mesma. Com efeito, a eventual invocação da alínea b) do n.º 3 do artigo 27.º da CRP apenas serviria o propósito de justificar o preenchimento – ou a possibilidade de preenchimento – de um dos fundamentos constitucio- nalmente admitidos para a privação da liberdade, «pelo tempo e nas condições que a lei determinar», mas não releva para a análise da norma legal objeto de fiscalização (n.º 2 do artigo 194.º do CPP). 9.2 Em segundo lugar, o artigo 28.º da CRP, também invocado como parâmetro da inconstitucionali- dade material, afigura-se relevante na medida em que convoca, em especial, o princípio da reserva constitu- cional do juiz quanto à aplicação da medida de coação de prisão preventiva, a qual tem natureza excecional (vide o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 555/08, de 19 de novembro de 2008, II, 9.), e o princípio do contraditório. No caso em apreço o artigo 28.º da CRP não releva todavia enquanto parâmetro da aferição da constitu- cionalidade da norma do n.º 2 do artigo 194.º do CPP, não servindo a sua invocação o propósito de justificar a competência para a aplicação de uma medida mais gravosa do que a requerida pelo Ministério Público. 9.3 Afastados dois dos parâmetros invocados pelo tribunal a quo para recusar a aplicação da norma do n.º 2 do artigo 194.º do CPP, importa apreciar a constitucionalidade da mesma à luz dos demais parâmetros cuja violação foi invocada – sem prejuízo da consideração de outros que se possam considerar relevantes no caso em apreço. 9.3.1 Quanto ao artigo 32.º, n.º 4, da CRP, cuja violação constitui fundamento da recusa de aplicação da norma do n.º 2 do artigo 194.º da CRP com fundamento em inconstitucionalidade material, esta dispo- sição consagra um caso especial de reserva de juiz de instrução. A CRP dispõe, no n.º 4 do artigo do artigo 32.º que «Toda a instrução é da competência de um juiz, o qual pode, nos termos da lei, delegar noutras entidades a prática dos atos instrutórios que não se prendam diretamente com os direitos fundamentais», o que configura, numa formulação pela positiva, uma reserva de competência do juiz de instrução do processo penal para a prática dos atos instrutórios que se prendam diretamente com os direitos fundamentais. Entende-se aqui consagrado o «princípio da judicialização da instrução», nas palavras de Gomes Ca- notilho e Vital Moreira, com a advertência de que “a Constituição não define onde começa a instrução” ( Constituição da República Portuguesa Anotada , vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, 2007, anotação ao artigo 32.º, p. 520). Na situação que nos ocupa, a reserva de competência do juiz é invocada na designada fase de inquérito, que precede a fase instrutória, de acordo com a classificação introduzida pelo legislador ordinário e plasmada no Código de Processo Penal de 1987, vigente. De uma forma clara, a síntese de Paulo Dá Mesquita: “O processo penal português organiza-se em três momentos, o inquérito, presidido pelo Ministério Público, a

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