TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
151 acórdão n.º 465/12 6. Nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 129.º do Código do Trabalho é proibido ao empregador obstar injustificadamente à prestação efetiva de trabalho. Sendo esta, de acordo com a própria epígrafe do artigo, uma das garantias do trabalhador, dela se conclui que se não põe em causa a existência de um direito daquele último à ocupação efetiva. Durante algum tempo, e como em geral é sabido, discutiu-se na doutrina a questão de saber se existiria ou não este direito no ordenamento jurídico português (para uma recensão da discussão, com a visão diferen- te que em relação a ela tinha já a jurisprudência, veja-se a fundamentação do Acórdão n.º 951/96, disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) . Face à atual redação do artigo 129.º do Código do Trabalho a discussão fica selada. Não restam dúvidas de que o direito existe, sendo conferido desde logo aos trabalhadores pela lei ordinária. Questão diferente, e não encerrada, é no entanto a de saber se a esse direito se pode atribuir (não obs- tante se encontrar a sua explícita sede formal apenas na lei) o estatuto substancial de direito fundamental, constitucionalmente tutelado. De acordo com uma certa corrente doutrinária, o direito a exercer efetivamente a atividade correspon- dente ao posto de trabalho incluir-se-á, a par da liberdade de procurar trabalho e do direito de igualdade no acesso a cargos, tipos de trabalho ou categorias profissionais, no âmbito de proteção da norma que consagra, na CRP, o direito ao trabalho (neste sentido, a anotação ao artigo 58.º da CRP: J. J. Gomes Canotilho/ Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , 4.ª edição, 2007, Vol. I, p. 764). Assim, e nos termos desta doutrina, não obstante este último direito vir textualmente consagrado no capítulo da Constituição referente aos “direitos económicos, sociais, e culturais”, na sua complexa estrutu- ra não deixarão de estar incluídas posições jurídico-subjetivas próximas das liberdades, porque dotadas da dimensão negativa ou defensiva que caracteriza estas últimas. O direito do trabalhador à ocupação efetiva, enquanto posição jurídico-subjetiva ainda inserta no âmbito geral de proteção do direito ao trabalho, será disso mesmo uma ilustração clara ( Constituição da República Anotada, loc. cit.), pelo que não poderá negar- -se-lhe a condição de posição jusfundamental, ou de direito constitucionalmente tutelado. Não se discute que haja direitos fundamentais que possam decorrer implicitamente do texto da Cons- tituição, por nele se encontrarem sem no entanto nele deterem uma sede formal explícita. Isto mesmo con- cluiu já o Tribunal, quando entendeu que o direito ao mínimo de sobrevivência condigna emergia, enquanto direito fundamental, da leitura conjunta dos artigos 1.º e 63.º da CRP (Acórdão n.º 509/02). Isto mesmo conclui em geral a doutrina, quando se refere à existência de normas [implícitas] de direitos fundamentais que, no texto da constituição, aparecem como normas adstritas ou subordinadas a outras normas ( Zugeord- nete Grundrechtsnormen: Robert Alexy, Theorie der Grundrechte, suhrkamp, 1986, p. 57). Do mesmo modo, não se discute que no âmbito de proteção das normas de direitos sociais se encontrem dimensões subjetivas com estrutura idêntica à das liberdades. A jurisprudência do Tribunal tem acentuado com tal constância a conclusão (por exemplo: Acórdãos n. os 372/91, 581/95, 683/99 e 632/08) que não vale a pena agora a ela voltar. Mas nada disto implica que se aceite, sem mais, a tese defendida pelo recorrente no presente recurso: em bom rigor, o fundamento de tal tese pode ser discutido independentemente da resolução da questão de saber se o direito à ocupação efetiva do trabalhador detém, no ordenamento jurídico português, o estatuto de direito fundamental. 7. Com efeito, a tese da inconstitucionalidade, que o recorrente defende, não aparece só sustentada na ideia segundo a qual o artigo 58.º da CRP, ao consagrar o direito ao trabalho, consagra implicitamente o direito do trabalhador à ocupação efetiva; para além disso, e como já se viu, alega o recorrente que o valor “trabalho” é de tal modo protegido pela Constituição que por força dela se opera uma inversão do ónus da prova em processo jus-laboral, nomeadamente quando, como é o caso, se discute nesse processo a questão de
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