TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
148 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. A. instaurou, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, ação contra IEP – Instituto de Estradas de Portugal, pedindo que fosse declarado ilícito o despedimento de que fora alvo, e que, consequentemente, fosse o Ins- tituto condenado, i. a. , a reintegrá-lo no seu posto de trabalho e a pagar-lhe o que mensalmente processava a seu favor mediante transferência bancária. Alegava, fundamentalmente, que a entidade empregadora havia lesado o seu direito à ocupação efetiva, visto que se recusara a dar-lhe por escrito ordens relativas ao exercício das funções que, conforme o acorda- do no contrato individual de trabalho, eram as suas (as de diretor do departamento de recursos humanos). Respondeu o Instituto de Estradas de Portugal, afirmando que, a partir de certa altura, A. faltara consecuti- vamente ao serviço, não comunicando antecipadamente qualquer falta. O Tribunal do Trabalho de Lisboa, se bem que considerando parcialmente procedente o pedido apre- sentado (condenando a ré num dos pedidos feitos pelo autor, cuja identificação é agora irrelevante), não declarou ilícito o despedimento. Apelou então A. para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo a ré interposto também recurso subordi- nado para o mesmo tribunal. A Relação, decidindo, revogou a sentença recorrida na parte em que esta atendera parcialmente ao pedi- do apresentado por A.. Quanto ao resto – e, principalmente, quando à ilicitude do despedimento –, manteve o que fora decidido pelo Tribunal do Trabalho de Lisboa. Interpôs então o autor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça. Nas respetivas alegações, sustentou que dos artigos 1.º, 2.º, 20.º, n.º 4, e 59.º, n.º 1, alínea b), da Cons- tituição da República (CRP) – que consagram os princípios da dignidade da pessoa humana e da máxima efetivação dos direitos fundamentais; do processo equitativo e da ocupação efetiva do trabalhador “em con- dições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal” – decorria uma conceptualização do Direito do Trabalho que repudiaria, em termos do ónus da prova da ocupação efetiva do trabalhador, a conceção civilista constante, fundamentalmente, dos artigos 516.º do Código do Processo Civil e 342.º, 343.º e 344.º do Código Civil. Por estes motivos, concluía, seria inconstitucional, por violação dos princí- pios já referidos, a leitura das regras relativas ao ónus da prova, feita pelo acórdão recorrido, visto que esse ónus caberia, in casu e por imposição constitucional, à entidade empregadora. 2. Por acórdão proferido a 13 de abril de 2011, o Supremo, depois de ter analisado as normas de direito infraconstitucional relativas ao ónus da prova, e de ter concluído que, face a elas, cabia inequivocamente ao autor da ação – que nela alegara estar em situação de inatividade profissional por nenhuma tarefa lhe ter sido distribuída – o ónus de provar a invocada facticidade, por esta incluir facto pretensamente constitutivo do direito que se pretenderia fazer valer em juízo, passou a examinar a questão de constitucionalidade que lhe havia sido colocada. E, quanto a esta, concluiu do seguinte modo: «Alega o recorrente que o regime civilista do ónus da prova – constante, fundamentalmente, do artigo 516.º do Código de Processo Civil e dos artigos 342.º, 343.º e 344.º do Código Civil – é, face à conceptualização cons- titucional do Direito do trabalho (com direta e necessária transposição para o direito processual laboral), mate- rialmente inconstitucional, por contender com o disposto na Constituição e com os princípios nela consignados, designadamente: a) com o artigo 1.º (enquanto nele se consagra o “princípio da dignidade da pessoa humana”); b) com o artigo 20.º, n.º 4, enquanto nele se consagra o “princípio da judicialidade” – na vertente de “processo equi- tativo” (base de um verdadeiro direito de justiça, no sentido de um processo justo em que seja garantida a igualdade
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