TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012

143 acórdão n.º 445/12 8. Um dos fundamentos de inconstitucionalidade invocado pelos recorrentes consiste em que a norma em causa estabelece uma diferenciação de tratamento entre o ofendido, nas suas vestes de acusador particular, e o Ministério Público no que respeita aos efeitos da acusação por ambos proferida, sem que exista qualquer fundamento legítimo para tal distinção. Neste aspeto, e no que respeita à pretensa violação do princípio da igualdade assim apresentada, os recorrentes não têm razão, sem prejuízo da oportuna ponderação da circuns- tância de a acusação respeitar a um crime particular. Em primeiro lugar, a operatividade do princípio geral da igualdade consagrado no n.º 1 do artigo 13.º da Constituição tem o limite do seu radical subjetivo (“Todos os cidadãos ....”), não sendo, desde logo pela próprio enunciado textual, parâmetro de validade de soluções normativas em que um dos entes em confronto ( os seus poderes, os efeitos dos seus atos) seja uma estrutura organizatória do poder público não recondutivel à condição de “cidadão” ( v. g. pessoa coletiva ou ente público em relação paritária). Assim, a mera transposi- ção das considerações em que habitualmente se analisa a observância do princípio da igualdade não seria aqui pertinente, porque a situação exorbita da hipótese do preceito constitucional. Obviamente sem prejuízo da componente isonómica que seja relevante na conformação ou densificação de outros princípios constitucio- nais, designadamente no princípio do processo equitativo ou no princípio da “igualdade de armas”. Em segundo lugar e mesmo que se duvide desta opção em que as estruturas organizatórias do Estado (os seus poderes, os efeitos dos seus atos) não são candidatos ou termo de comparação para efeito do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição, no processo penal, a posição do assistente nunca po- deria ser comparada, como sujeito processual, com a do Ministério Público. O Ministério Público é o órgão integrado na organização dos tribunais a que a Constituição comete o exercício da ação penal (artigo 219.º, n.º 1, da Constituição). As exigências do processo equitativo exigirão certamente que, quando esteja em causa pretensões contrapostas entre sujeitos processuais, os seus poderes sejam equiparáveis no que respeita à possibilidade de influenciar a decisão do juiz. Mas já não pode reclamar-se identidade ou equiparação de poderes ou de consequência da ação quando o que está em causa não é o confronto processual entre sujeitos de pretensões contrapostas, mas a conformação dos efeitos substantivos de determinada atuação processual. Por outro lado, seja qual for a natureza do crime, seja este de natureza pública, semipública ou parti- cular, o jus puniendi é sempre do Estado, não um direito subjetivo que integre a esfera jurídica do ofendido embora para ser exercido através dos tribunais. Deste modo, a circunstância de a lei atribuir ao Ministério Público especiais poderes processuais, ou de fazer decorrer efeitos substantivos de atos processuais do Mi- nistério Público que não reconhece a atos de função processual idêntica quando praticados pelo assistente, não viola, por si mesma, o princípio da igualdade. O estatuto constitucional do Ministério Público no que à titularidade da ação penal respeita constitui suporte constitucional bastante para a diferente atribuição de efeitos jurídicos substantivos a atos processualmente idênticos. 9. O recorrente sustenta que a norma em apreciação implica uma restrição do acesso do ofendido ao Direito e à tutela jurisdicional efetiva, mediante processo equitativo, conferido pelos artigos 20.º, n. os 1 e 4, da Constituição, restrição que, em si mesma, viola a Constituição [cfr. artigo 20.º da Constituição, e artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH), ex vi do artigo 16.º, n.º 2, da Constituição] e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) (cfr. artigo 6.º, n.º 1, da referida Convenção, clara emanação do artigo 10.º da DUDH), porquanto implicam uma anulação efetiva da possibilidade de o ofendido ver tutelados os seus direitos, no procedimento criminal, privando-o, enquanto acusador particu- lar, de um tratamento equiparado ao dado ao acusador público. O que anteriormente se disse vale, também neste parâmetro, quanto a este última afirmação da recor- rente. Não procede a pretensão de tratamento legislativo equiparado ao que é dado ao Ministério Público, enquanto reivindicação de tratamento igual, porque o que está em causa não é uma “igualdade de armas” em pretensões contrapostas, mas a determinação de efeitos substantivos da ação e aí a diferenciação pode encontrar respaldo no próprio estatuto e função constitucionalmente atribuída ao Ministério Público.

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