TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
109 acórdão n.º 441/12 Nestes termos, a “norma” extraída da literalidade do n.º 1 do artigo 49.º da LGT não correspon- dia a uma norma necessariamente estranha ao sistema tributário. Plausivelmente nele se conteria, a ponto de poder ser extraída por via de interpretação (na aceção estrita do termo enquanto processo comum de determinaçãodo sentido de uma coisa, que sendo já um sentido presente, se não encontra porém imedia- tamente desvelado). Nestas circunstâncias, a remissão para o regime do Código Civil poderia não ser mais do que isso – uma remissão certificativa da similitude de soluções encontradas para o problema quer no seio do sistema civilístico quer no seio do sistema tributário –, ao invés de se apresentar, inelutavelmente, como uma nova norma, criada pelo intérprete com recurso à analogia, para preencher o vazio que o legislador, na incompletude da sua regulação, deixara. Não quer isto dizer que a questão não pudesse ser, sob o ponto de vista da melhor aplicação ou in- terpretação do direito ordinário, controversa; o ponto é irrelevante, para efeitos do juízo que o Tribunal Constitucional tem, neste momento, que fazer. O que é relevante é que se não pode concluir, sem margem para dúvidas, que, in casu , o processo interpretativo seguido pelo tribunal a quo se terá traduzido na criação de uma “norma” por parte do juiz, com recurso aos instrumentos próprios do pensamento analógico, e, por isso, através do emprego de meios hermenêuticos que a Constituição, nos termos do n.º 2 do artigo 103.º inequivocamente proíbe. Neste contexto argumentativo não pode logicamente colocar-se a questão da constitucionalidade orgâ- nica enquanto questão autónoma. 9. O recorrente, finalmente, também questiona a constitucionalidade da norma sob juízo quando con- frontada com os parâmetros da segurança jurídica, da proteção da confiança e do direito a um processo equitativo, na sua dimensão do direito à decisão em prezo razoável (artigo 20.º, n.º 4, da CRP). O que há de específico nesta alegação é que, com ela, se não questiona já o processo interpretativo que culminou na norma extraída do n.º 1 do artigo 49.º da LGT; o que se questiona é essa norma, em si mesma considerada. Diz-se que ler este preceito na dimensão interpretativa adotada (segundo a qual, recorde-se, a apresentação de impugnação judicial, para além de interromper o decurso do prazo de prescrição, suspende ou protela o início desse mesmo prazo para o momento em que transitar em julgado a respetiva decisão) alarga indefi- nidamente o prazo de prescrição, porque faz depender a sua verificação de um incerto an e de um incerto quando (a emissão de uma decisão judicial), o que será em si mesmo contrário aos fins de segurança jurídica e de proteção da confiança que fundamentam o próprio instituto da prescrição. Além do mais – diz-se – este alargamento indefinido do prazo de prescrição afigura-se contrário ao direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável e em processo equitativo (artigo 20.º, n.º 4, da CRP). A leitura que o recorrente faz desta norma (e que, nas suas alegações, aparece inextrincavelmente ligada a considerações de regime próprias do n.º 3 do artigo 49.º da LGT, na redação à altura vigente, o que, como já vimos, foi excluído do objeto do recurso) pressupõe que se reduza a emissão de uma decisão judicial, não só ao domínio dos puros factos, mas, mais do que isso, a eventos futuros que só podem ser representados por associação a um grau acentuado de contingência de verificação. Mas como não é certamente essa a lei- tura que, em conformidade com a Constituição, se deve fazer do preceito legal – e, como fora dela, se não compreende a alegação da inconstitucionalidade –, ainda aqui nenhuma razão haverá para que se censure a norma sob juízo, constante do n.º 1 do artigo 49.º da LGT. III – Decisão Pelos fundamentos expostos, o Tribunal decide: a) Não julgar inconstitucional a norma constante do n.º 1 do artigo 49.º da Lei Geral Tributária, na redação anterior à da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, quando interpretado no sentido
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