TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
108 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL do artigo 49.º da LGT que “[a] citação, reclamação, o recurso hierárquico e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição”. Ora, deste preceito, com esta literalidade, retirou o tribunal a quo a “norma” que aplicou ao caso concreto: a apresentação de impugnação judicial, para além de interromper o decurso do prazo de prescrição, suspende ou protela o início desse mesmo prazo para o momento em que transitar em julgado a respetiva decisão. [Recorde-se que, no requerimento de interposição do recurso, havia sido indicada como “sede” da “norma” questionada, também, o n.º 3 do referido artigo da LGT. No entanto, como o acórdão recorrido, decidindo sobre um pedido de reforma de decisão anterior, eliminou, por considerar tratar-se de “lapso manifesto”, o parágrafo dessa mesma decisão em que se considerara aplicável ao caso o n.º 3 do artigo 49.º, ficou, por despacho proferido já no Tribunal Constitucional, circunscrito o objeto do recurso de constitucio- nalidade à norma constante do n.º 1]. Dizendo de outro modo, da literalidade do n.º 1 do artigo 49.º da LGT, acima transcrita, retirou a decisão recorrida uma tripla conclusão: (i) a de que era duradouro o efeito interruptivo do prazo de prescri- ção decorrente da apresentação de impugnação judicial; (ii) a de que esse efeito durava enquanto durasse o processo que fora iniciado pela apresentação da referida impugnação; (iii) que, uma vez findo esse processo, com o trânsito em julgado da respetiva decisão judicial, o efeito interruptivo se “degradava” em suspensivo, visto que voltava então a correr o prazo de prescrição, somado desta vez ao que já correra até à data da apre- sentação da impugnação judicial. Ora, no dizer da recorrente, esta “norma”, sem correspondência alguma com a letra da lei vigente no momento da prática dos factos – mas correspondendo, depois, à solução que viria textualmente a ser adotada pelo legislador, quando, através da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, aditou um n.º 4 ao artigo 49.º da LGT – , foi obtida porque o aplicador da lei fiscal, recorrendo à analogia, a foi buscar, fora do sistema da lei tributária, aos artigos 326.º e 327.º do Código Civil. Um tal procedimento de obtenção da norma aplicável ao caso contende porém com a garantia da lex coerta, que vai ínsita nos n. os 2 e 3 do artigo 103.º da CRP. Deve no entanto sublinhar-se que, justamente à altura da prática dos factos, ou seja, antes da início da vigência da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro (que veio aditar o n.º 4 ao artigo 49.º da LGT), a reda- ção literal deste último preceito continha um n.º 2, segundo o qual “[a] paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior [o efeito interruptivo da prescrição, provocado pela apresentação de impugnação judicial], somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao tempo que tiver recorrido atá à data da autuação.” Esta solução, decorrente portanto do preceito aplicável ao caso (do n.º 2 do artigo 49.º da LGT), já constava do artigo 34.º, n.º 3, do Código de Processo Tributário, e, antes deste último, do artigo 27.º do velho Código de Processo das Contribuições e Impostos. Era, por isso, uma solução com algum curso de tra- dição entre nós. Além disso, era também uma solução que pressupunha, na sua literalidade, a existência dos três elementos integrantes da “norma” que, no caso, o tribunal a quo extraiu do n.º 1 do artigo 49.º da LGT. Na verdade, só era pensável que o legislador dissesse (como o vinha dizendo tradicionalmente) que o efeito interruptivo da prescrição se “degradava” em efeito suspensivo caso o processo ficasse parado por facto não imputável ao contribuinte por período superior a uma ano se, com anterioridade lógica, fosse dado como assente não apenas que a apresentação de impugnação judicial (facto iniciador do processo) interrompia o decurso de prazo de prescrição – o que constava da literalidade do n.º 1 do artigo 49.º da LGT, do n.º 3 do artigo 34.º do Código de Processo Tributário e do artigo 27.º do Código de Processo das Contribuições e Impostos – mas ainda que: (i) era duradouro o efeito interruptivo do prazo de prescrição provocado pela referida apresentação; (ii) que esse efeito duraria enquanto durasse o processo; (iii) e que ele viria a “degradar- -se” em efeito suspensivo uma vez findo naturalmente esse processo, com o trânsito em julgado da corres- pondente decisão judicial. Com efeito, se se previa que tal efeito sobreviesse caso, estando o processo parado por facto não imputável ao contribuinte, passasse um ano desde a apresentação da impugnação judicial, por maioria de razão se concluiria que o mesmo efeito se daria se o processo, ao invés de ficar parado, viesse a findar naturalmente, com o trânsito em julgado da respetiva decisão judicial.
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