TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012

104 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 2. Desta decisão interpôs A., SGPS, S. A., recurso para o Tribunal Constitucional. No respetivo requerimento de interposição, disse que recorria ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional: LTC), e que pedia que o Tribunal apreciasse a “inconstitucionalidade orgânica e material do artigo 49.º, n. os 1 e 3 da LGT, na reda- ção anterior à da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, se interpretado no sentido de que a apresentação de impugnação judicial, para além de interromper o decurso do prazo de prescrição, suspende ou protela o início desse mesmo prazo para o momento em que transitar em julgado a respetiva decisão.” Já no Tribunal, foi ordenada a produção de alegações, com a advertência de que o objeto do recurso se deveria circunscrever à norma contida no n.º 1 do artigo 49.º da LGT, na redação anterior à Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, na dimensão interpretativa enunciada no requerimento de interposição, uma vez que o disposto no n.º 3 do mesmo artigo não fora aplicado pela decisão recorrida. 3. Aceite esta advertência, e circunscrito deste modo o objeto do recurso, apresentaram quanto a ele A., SGPS, S. A., e a Fazenda Pública, respetivamente, as suas alegações e contra-alegações. Sustentou a primeira a tese da inconstitucionalidade, que fundamentou, antes do mais, na ideia segundo a qual se configuram como garantias dos contribuintes, para efeitos do disposto no artigo 103.º da Constituição, os prazos de prescrição das dívidas tributárias, bem como os fatores interruptivos e (ou) suspensivos do seu decurso e as consequências decorrentes da interrupção e (ou) suspensão. Assim sendo, a norma aplicada pela decisão recorrida seria material e organicamente inconstitucional. Materialmente inconstitucional, primeiro, porque lesiva da reserva material de lei que o n.º 2 do artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) consagra, quando fixa o princípio básico da legalidade tributária, princípio esse aplicável ainda às garan- tias dos contribuintes e, portanto, ao próprio regime de decurso do prazo de prescrição das dívidas tributárias. É que, no dizer da recorrente, de tal princípio de legalidade decorreria a proibição, para os aplicadores da lei, do recurso à interpretação analógica quanto à determinação dos “elementos essenciais do imposto”, neles incluindo o regime do decurso do prazo de prescrição das dívidas tributárias; ora, no caso concreto, o tribunal a quo , para retirar do n.º 1 do artigo 49.º da LGT (na redação anterior à Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro) a norma que agora se submetia ao juízo do Tribunal Constitucional recorrera efetivamente à analogia ao invocar o regi- me vigente no Direito Civil, o que lesava, portanto, o princípio da legalidade constante do artigo 103.º da CRP. Além do mais, e justamente por causa desse mesmo princípio, a norma em juízo padeceria ainda de inconstitu- cionalidade orgânica. Isto porque, sendo a lei a que se refere o n.º 2 do artigo 103.º da CRP, necessariamente, ato legislativo da Assembleia da República, ou ato legislativo do Governo devidamente autorizado pelo Parla- mento [artigo 165.º, n.º 1, alínea i), e n.º 2], no caso, a norma em juízo não fora autorizada pela Assembleia da República, visto que se cifrava em alargamento do prazo de prescrição, quando a lei de autorização legislativa pertinente (ao abrigo da qual fora redigido o n.º 1 do artigo 49.º da LGT agora em apreciação) apenas habi­litara o Governo para legislar no sentido do encurtamento (e não do alargamento) do prazo de prescrição. Contra-alegou a Fazenda Pública, contestando quer a tese da inconstitucionalidade material quer a tese da inconstitucionalidade orgânica. Quanto à primeira, disse que não tendo havido, in casu , qualquer recurso à analogia – relevando a invo­ cação, por parte do tribunal a quo e para a determinação dos efeitos da interrupção do decurso do prazo de prescrição [da dívida tributária], do regime de Direito Civil, não da necessidade do preenchimento de qualquer lacuna, mas da simples aplicação de um processo hermenêutico comummente usado –, nenhuma razão haveria para que se considerasse que a norma sob juízo violava a reserva material de lei constante do n.º 2 do artigo 103.º da CRP. Por outro lado, disse ainda a Fazenda Pública, também nenhum motivo haveria para que se considerasse lesada a reserva (orgânica) de lei da Assembleia da República, uma vez que a norma aplicada pela decisão recorrida, e resultante do processo hermenêutico comum, se não cifrava (ao contrário do que pretenderia a recorrente) em um qualquer alargamento do prazo de prescrição, para o qual não estaria habilitado o legis- lador governamental.

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