TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
89 acórdão n.º 397/12 Os atos de tráfico, onde se incluem as condutas de comercialização, disponibilização e publicidade, no Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, são tipificados como ilícito penal quando se reportam “a plantas, substâncias e preparações referidas nas convenções relativas a estupefacientes ou substâncias ratificadas por Portugal e respetivas alterações, bem como outras substâncias incluídas nas tabelas anexas ao presente diploma” (artigo 3.º). Definidas a ordenação e o elenco dessas tabelas, estipula-se no artigo 2.º a sua atualiza- ção obrigatória “de acordo com as alterações aprovadas pelos órgãos próprios das Nações Unidas, segunda as regras previstas nas convenções ratificadas por Portugal ou por diploma das Comunidades Europeias”. Pode, assim, afirmar-se, uma identidade entre o critério subjacente à classificação portuguesa e aquele decorrente do regime convencional, assente na elaboração científica da Organização Mundial de Saúde (OMS), e também do direito da União Europeia. Desde a sua publicação, foram aditadas às tabelas anexas plantas, substâncias ou preparados pelos Decretos-Leis n. os 214/2000, de 2 de setembro, 69/2001, de 24 de fevereiro, 47/2003, de 22 de agosto, 14/2005, de 26 de janeiro, 18/2009, de 11 de maio e 13/2012, de 26 de março. Para todas essas plantas, substâncias e preparados, a sua venda ou disponibilização ao público, apenas pode ter lugar em farmácias, mediante prescrição médica (artigos 15.º e 16.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro). O elenco das substâncias enumeradas nessas tabelas resulta de um procedimento de âmbito internacio- nal complexo e rigoroso que indica um padrão no que respeita à determinação das substâncias psicoativas que encerram um determinado nível de perigosidade para a saúde humana, o qual se apoia nas informações prestadas pelos organismos responsáveis nacionais e internacionais e por estudos médico-científicos, nomea- damente os pareceres da OMS, que sopesam fatores de saúde pública e de impacto social. Nos termos do preâmbulo do diploma em apreço, a iniciativa legislativa foi justificada pelo apareci- mento das denominadas smart shops e a venda do que se designa por “drogas legais”, fenómeno que não teria encontrado solução eficaz no aditamento efetuado pela Lei n.º 13/2012, de 26 de março, de mais duas substâncias à tabela II-A, anexa ao Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro. O problema do acréscimo de consumo de novas substâncias psicoativas sintéticas e a emergência do comércio, seja em estabelecimentos abertos ao público, seja por via online, tem constituído preocupação de diversas instâncias internacionais. No relatório anual, incidente sobre o ano de 2011, elaborado pelo Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência (OEDT) e pela Europol, sobre a aplicação da Decisão 2005/387/JAI, do Conselho da União Europeia, de 10 de maio de 2005, relativa ao intercâmbio de informações, avaliação de riscos e con- trolo de novas substâncias psicoativas (publicada no Jornal Oficial da União Europeia, L 127, de 20 de maio de 2005, pp. 32-37), no que concerne ao surgimento destas substâncias não contempladas em qualquer das listas previstas nas convenções internacionais neste domínio, designadas por “euforizantes legais”, informa-se da notificação, ao abrigo do sistema de alerta instituído na UE, de múltiplas novas substâncias psicoativas nos anos recentes e a proliferação de lojas especializadas – denominadas head shops ou smart shops . Essa situação convoca a reflexão sobre a reação ao fenómeno e, na pronúncia do OEDT, a necessidade de adoção de medidas sancionatórias não apenas reativas, mas também proactivas, tendo em atenção a capa- cidade da produção de novas substâncias psicoativas apenas com a alteração de um dos seus componentes, sem postergar a necessidade de identificar, com o mínimo de precisão e clareza, a substância psicoativa con- trolada. Reconhecendo-se os elevados custos e a complexidade em detetar e identificar as novas substâncias, afirma-se a impossibilidade jurídica de criminalizar a distribuição não autorizada de todas as substâncias psicoativas, e por isso, a inevitabilidade da legislação apenas poder reagir às substâncias à medida que elas vão surgindo e vão sendo identificadas e classificadas como perigosas para a saúde humana, tendo para o efeito sido criado um sistema de alerta rápido, com funcionamento simultâneo a nível europeu e internacional, implementado pela OEDT e a Europol, enquanto rede pluridisciplinar, que recolhe, analisa e divulga as informações sobre novas drogas, procedendo à avaliação dos seus riscos, o que reforça a ideia da necessidade da clara e especifica definição das substâncias psicoativas de modo a legitimar o seu controlo legislativo.
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