TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
85 acórdão n.º 397/12 Nos termos do Decreto-Lei n.º 9/2002, de 24 de janeiro, tendo em atenção as graves consequências para a saúde do consumo excessivo de álcool, para além da sua associação com outras condutas socialmente desvaliosas, estabelece-se a proibição de venda e a colocação à disposição, com objetivos comerciais, em locais públicos e em locais abertos ao público, de álcool a menores de 16 anos [alínea a) do n.º 1 do artigo 2. º] e a quem se apresente notoriamente embriagado ou aparente possuir anomalia psíquica [alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º]. Também a venda de bebidas alcoólicas nas cantinas, bares e outros estabelecimentos de restauração e de bebidas acessíveis ao público localizados nos estabelecimentos de saúde e a venda de bebidas alcoólicas em máquinas automáticas encontra-se igualmente proibida [alíneas a) e b) do artigo 3.º]. No plano sancionatório, o mesmo diploma instituiu um tipo contraordenacional para a violação dessas proibições de venda e de disponibilização (artigo 7.º, n. os 1 e 2), podendo ser aplicada, para além da coima, a perda do produto da venda e a interdição, até um período de dois anos, do exercício da atividade direta- mente relacionada com a infração praticada, nos casos da venda a menor de 16 anos, a quem se encontre notoriamente embriagado ou aparente possuir anomalia psíquica, em função da gravidade e reiteração das infrações [alíneas a) e b) do artigo 8.º]. Por seu turno, no domínio da proteção dos cidadãos da exposição involuntária ao fumo do tabaco e criação de medidas de redução da procura relacionadas com a dependência e a cessação do seu consumo, e em execu- ção da Convenção Quadro da Organização Mundial de Saúde, aprovada pelo Decreto n.º 25-A/2005, de 8 de novembro, a Lei n.º 37/2007, de 14 de agosto, veio, no seu artigo 15.º proibir a venda de produtos do tabaco num conjunto de locais [alínea a) do n.º 1], em certas circunstâncias em máquinas de venda automática [alínea b) do n.º 1], a menores de 18 anos [alínea c) do n.º 1] e através de televenda [alínea d) do n.º 1]. Também aqui, o regime sancionatório, previsto no capítulo VIII deste diploma, envolve a previsão de infrações contraordena- cionais, encontrando-se a violação da proibição de venda tipificada no artigo 25.º, n.º 1, alínea e) . Desta descrição parece resultar que a opção pelo recurso ao direito penal ou ao direito de mera ordena- ção social depende do tipo de substância cujo consumo se visa impedir, tendo em conta não só o seu grau de danosidade para a saúde humana, mas também a divulgação e aceitação social do seu consumo. Tudo indica que estamos num daqueles casos em que «não existirá óbice indispensável a que – em zonas delimitadas, onde a distinção, por virtude de historicidade inevitável dos valores, se torne particularmente duvidosa – um substrato essencial e objetivamente idêntico possa constituir em certos casos um ilícito penal, noutros um ilícito de mera ordenação social» ( Figueiredo Dias, na ob. e loc. cit .). Acresce que, estando nós perante o sancionamento de um comportamento justificado apenas pela sua perigosidade típica para um determinado bem jurídico, a intervenção do direito penal, apesar de possível, reveste um caráter excecional, pressupondo a verificação de exigentes requisitos. Por estas razões, dificilmente se poderá afirmar que nos encontramos perante condutas que, face à ordem axiológica constitucional, pertençam indiscutivelmente ao direito penal. A esta conclusão não se opõe a consideração de que a mesma Assembleia Legislativa da Região Autó- noma da Madeira aprovou Resolução que consubstancia iniciativa legislativa dirigida à Assembleia da Repú- blica no sentido de inscrever no âmbito do regime penal todas as substâncias psicoativas, acrescentando às plantas, substâncias e preparações controladas por legislação própria, previstas nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, as demais, (ainda) não controladas, “não obstante produzirem os mesmos efeitos”. A apreciação do mérito e da oportunidade dessa iniciativa legislativa, assim como do programa político- - criminal que lhe está subjacente, não suspende ou restringe por qualquer forma a atuação da Assembleia Legis- lativa da Região Autónoma da Madeira, no exercício das competências que lhe são atribuídas pela Constituição, entre as quais a de definir atos ilícitos de mera ordenação social e respetivas sanções [artigo 227.º, n.º 1, alínea q), da Constituição], respeitados que sejam os princípios materiais que regem essa qualificação. Cabe referir que, em todos os regimes apresentados, seja no regime penal do tráfico de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, seja nos regimes sancionatórios contraordenacionais acima referidos, encontra-
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