TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
52 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 46. º Como o Tribunal Constitucional afirmou no acórdão que vimos citando, “a Assembleia pode rejeitar as pro- postas do Governo, pode negar-lhe instrumentos de governação ( v. g. não aprovação do Orçamento, recusa de autorizações legislativas), pode criticá-lo e pode, em último extremo, provocar a sua demissão mediante moções de censura [artigos 194.º e 195.º, n.º 1, alínea f ) , da CRP]. Pode mesmo adotar leis contrárias ao programa do Governo, alterando as opções primárias do regime jurídico em determinado domínio – mesmo da função pública, com os limites materiais e o previsto no artigo 167.º, n.º 3, da CRP – a que a Administração tem depois de con- formar a sua atuação, seja mediante atos individuais de execução, seja no exercício da competência regulamentar. Compete-lhe, como já se referiu, apreciar os atos do Governo e da Administração, sejam eles de natureza normativa ou de aplicação individual e concreta [artigo 162.º, alínea a), da CRP], podendo criticar o modo como essa ativi- dade é desenvolvida e, inclusivamente, dirigir-lhe recomendações, o que aliás fez, mediante as referidas Resoluções n.º 93/2011 e n.º 94/2011. Mas não pode ordenar-lhe a prática de determinados atos políticos ou a adoção de determinadas orientações (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, loc. cit. , p. 414).” 47. º Está assim em causa uma intromissão intolerável da Assembleia Legislativa na esfera puramente administrativa do Governo Regional, em domínios que são próprios da sua atividade executiva (o exercício da função acionista) detetando-se, por consequência, um desrespeito dos “limites constitucionais de natureza funcional à liberdade e extensão de conformação do legislador” (expressão de Gomes Canotilho, em anotação ao Acórdão n.º 1/97, in Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 129.º, p. 82). 48. º Ao emitir uma instrução para uma empresa pública, a Assembleia Legislativa está a invadir uma competência típica do Governo Regional – o exercício do poder administrativo – interferindo numa esfera de competência que não lhe pertence e que se retira, implicitamente, do disposto nos artigos 227.º e 231.º da Constituição. 49. º Como observa Paulo Otero, “se o princípio da separação de poderes (…) garante à Administração Pública um espaço de execução normativa da lei, a verdade é que também deverá inibir o legislador de se transformar em exe- cutor individual e concreto das próprias leis.” (in Legalidade e Administração Pública , Almedina, Coimbra, 2003, pp. 732‑733). 50. º Assim, seguindo o raciocínio do mesmo autor, «todas as leis parlamentares que traduzam o exercício de com- petência administrativa, violando a “reserva de caso concreto” a favor dos órgãos administrativos são, além de orga- nicamente inconstitucionais, materialmente violadoras do princípio da separação de poderes.» ( ibidem , p. 734). 51. º Pelo que a aprovação, pela Assembleia Legislativa, de um diploma contendo uma instrução precisa e obje- tiva dirigida a uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, porque equivalendo ao exercício de um poder de um acionista público, de natureza tipicamente administrativa, acarreta a deteção de um vício de inconstitucionalidade orgânica e de um vício de inconstitucionalidade material. 52. º Registe‑se, numplanomeramente teórico e especulativo, que a competência administrativa doGovernoRegional relativamente às empresas públicas regionais está circunscrita pelo Decreto Legislativo Regional n.º 13/2010/M, de 5 de agosto, e pelos poderes conferidos ao acionista público aí previstos (cfr. artigo 32.º do presente requerimento)
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