TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012

464 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 11.9 Pelo que, tendo o pretendido referendo por objeto a matéria da reorganização administrativa ter- ritorial autárquica e, em concreto, a reorganização administrativa obrigatória do território das freguesias, no que à freguesia de Crestuma diz respeito, com vista à emissão de parecer (ainda que não obrigatório e não vinculativo) pela respetiva assembleia de freguesia, o teor e o sentido da deliberação produzida pelo corpo de eleitores que participaria no referendo local em apreço vincularia a Assembleia de Freguesia de Crestuma quanto ao teor e ao sentido do parecer a emitir, na matéria em causa, no exercício da competência conferida pelo artigo 11.º, n.º 4, da Lei n.º 22/2012, de 30 de maio. E os quesitos referendários deveriam permitir, de modo imediato, sem qualquer mediação interpreta- tiva, o apuramento inequívoco do sentido da vontade popular, expressa através daquela deliberação produ- zida pelo corpo de eleitores participantes no referendo (mediante a resposta aos mesmos) e, assim, a corres- pondente determinação do sentido do ato (parecer), sobre a matéria submetida a referendo, a aprovar pela Assembleia de Freguesia de Crestuma – que correspondente a uma competência conferida a título consultivo – no quadro do procedimento complexo previsto na Lei n.º 22/2012, de 30 de maio. 11.10 Sucede que a formulação simultânea, concorrente e não subsidiária das três perguntas referen- dárias – cada uma delas referente a uma hipótese de junção da freguesia de Crestuma com uma freguesia ( limítrofe) distinta – não permite uma resposta concludente ou inequívoca quanto à real vontade do elei- torado chamado a pronunciar-se por via de referendo e, nessa medida, quanto ao próprio sentido do pare- cer, ou – como se afirmou no Acórdão deste Tribunal n.º 360/91, de 9 de julho e se reiterou no Acórdão n.º 495/99, de 15 de setembro, a propósito de uma situação “estruturalmente” idêntica à que se encontra sub judice, em que se apreciava a formulação concorrente de três quesitos referendários – «(…) o apuramento de um resultado concludente, ou seja, o apuramento da vontade maioritária do universo dos cidadãos eleitores consultados (basta pensar que o maior número de respostas positivas recebido por uma pergunta, podia ser igual ou inferior à soma das respostas positivas recebidas pelas outras; e que nesse caso, ficaria por apurar se, em face de um tal resultado, a maioria dos eleitores não se pronunciaria, afinal, por outra solução)» (cfr., respetivamente, n.º 5 e II – Fundamentos, n.º 4). E tratando-se, como sucede no caso em apreço, da formulação simultânea de três perguntas concor- rentes entre si – e, nessa medida, correspondentes a três soluções (alternativas) de junção da freguesia de Crestuma – ainda que se pudesse vislumbrar, em teoria, a hipótese oposta de o número de respostas posi- tivas recebido por uma pergunta ser superior à soma das respostas positivas recebidas pelas outras duas configurando prima facie um resultado (maioritário) concludente quanto ao sentido da vontade popular, tal resultado concludente sempre ficaria prejudicado pela incerteza quanto à verificação dos (necessários) pressu- postos segundo os quais, no caso de formulação de três perguntas concorrentes entre si, os cidadãos eleitores deveriam exprimir a sua vontade em relação a todas as três perguntas e só poderiam responder positivamente a uma delas e deveriam responder negativamente às demais [vide quanto à questão Maria Benedita M. P. Urbano, op. cit., p. 259, nota (460)]. 11.11 Como se afirma ainda no mesmo Acórdão n.º 360/91 (cfr. n.º 5), a inconcludência do resultado decorrente de uma votação realizada em tais circunstâncias – votação em relação a três perguntas concor- rentes, ainda que cada uma formulada isoladamente para respostas de sim ou de não, como sucede no caso em apreço – e respetiva demonstração matemática é conhecida como paradoxo de Condorcet ou paradoxo de Borda ( vide Condorcet, “Discours préliminaire de l’essai sur l’application de l’analyse à la probabilité des décisions rendues à la pluralité des voix” in Sur les élections et autres textes , Fayard, 1986, pp. 7 e segs., em especial pp. 60 e segs. e Mathématique et societé, Coll. Savoir, Hermann, 1974, pp. 183 e segs.; e, ainda, Pierre Favre, La décision de majorité , in Cahiers de la Fondation Nationale de Sciences Politiques, n.º 205, Presses de la fondation nationale des sciences Politiques, 1976, pp. 33 e segs., em especial pp. 41 e segs.).

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=