TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
454 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Confrontando os respetivos regimes, pode concluir-se que, quanto a essa matéria, ambos partilham a mesma teleologia fundamentante, devendo reconhecer-se que, em qualquer dos casos, a previsão de tais limites temporais tem como finalidade evitar eventuais “confusões” entre atos eleitorais e consultas populares ou destas entre si, como pode- ria suceder nos casos em que se solicitasse, num momento temporal coincidente ou bastante aproximado, a interven- ção do mesmo colégio eleitoral, ou de parte deste. Como refere Benedita Urbano, ainda que a propósito dos limites temporais do referendo de âmbito nacional (“O referendo – Perfil Histórico-evolutivo do Instituto – Configuração Jurídica do Referendo em Portugal”, in Boletim da Faculdade de Direito – Studia Juridica, 30, p. 213), “ o legislador constituinte terá sem dúvida sido fortemente sensibilizado pelo argumento da confusão – a repercutir-se numa even- tual distorsão dos resultados – que resultaria da realização simultânea (ou temporalmente bastante próxima) de um referendo e de eleições para cargos políticos – confusão e distorsão que se manifestariam em ambos os atos eleitorais, naturalmente em consequência das recíprocas interferências que cada um operaria em relação ao outro (no fundo e genericamente falando, ter-se-á pretendido evitar fricções entre o referendo e o regime representativo)”. Nessa mesma linha, Gomes Canotilho/Vital Moreira ( in Constituição da República Portuguesa Anotada , Volume II, 4.ª edição, nota X ao artigo 115.º, Coimbra, p. 106), referem que a previsão dos referidos limites temporais do referendo “visa garantir a sua autonomia face aos sufrágios eleitorais, procurando evitar que eles sejam contamina- dos pelos resultados destes (e vice-versa) e a promover a independência face às escolhas partidárias dos eleitores”. Ora, considerando o alcance da limitação temporal em apreço, constata-se que o interesse que nela vai acau- telado não é posto em causa ou afetado na situação emergente dos presentes autos em que se pondera a convo- cação de um referendo local num município não pertencente à Região Autónoma onde vai ocorrer a eleição dos deputados à respetiva Assembleia Legislativa, por não existir coincidência entre as esferas territoriais envolvidas, e, consequentemente, por ser diferente o colégio eleitoral que intervirá em ambos os atos. Nessa medida, se, por um lado, os interesses perseguidos pela limitação temporal constante do artigo 8.º da LORL não se encontram minimamente afetados nos presentes autos, e se, por outro lado, a própria intenciona- lidade prático-normativa do preceito impõe uma diferenciação das hipóteses gramaticalmente previstas à luz do problema normativo regulado, justifica-se, perante tais pressupostos, uma redução teleológica do artigo 8.º da LORL, perante a qual se pode concluir pela inexistência de violação dos limites temporais aí previstos.». 16.7 Situação idêntica à subjacente ao referido Acórdão n.º 435/11 se verifica no caso presente, em que o ato eleitoral convocado não tem âmbito nacional, mas sim âmbito regional (Região Autónoma dos Aço- res) e está em causa a realização de um referendo local numa freguesia não pertencente à Região Autónoma onde vai decorrer a eleição dos deputados à respetiva Assembleia Legislativa (Açores), pelo que inexistem no presente caso circunstâncias que justifiquem a alteração do entendimento expresso no referido Acórdão n.º 435/11, concluindo-se assim pela inexistência de violação dos limites temporais previstos no artigo 8.º da LORL (no sentido de nada dever impedir a realização simultânea de eleições de âmbito regional e a realização de um referendo a nível local, estando o essencial nesta hipótese «na clara distinção de objetos de decisão», se pronuncia Jorge Miranda ( Manual de Direito Constitucional, Tomo VII, Estrutura Constitucional da Demo- cracia , Coimbra, Coimbra Editora, 2007, p. 313). 17. Quanto à formulação das perguntas referendárias o referendo local em apreço padece de ilegalidade porquanto a formulação das mesmas não obedece aos critérios constantes do n.º 2 do artigo 7.º da LORL, nos termos do qual «As perguntas são formuladas com objetividade, clareza e precisão e para respostas de sim ou não, sem sugerirem direta ou indiretamente o sentido das respostas». 17.1 De acordo com a deliberação de 28 de junho de 2012 da Junta de Freguesia, enquanto órgão exe- cutivo detentor de iniciativa representativa (cfr. artigo 11.º da Lei n.º 22/2012, de 30 de maio), as duas per- guntas constantes da «proposta» (denominada «proposta de deliberação» no artigo 11.º da Lei n.º 22/2012), a ser entregue «para apreciação e aprovação da Assembleia de Freguesia de Crestuma», anexa ao requerimento da Presidente da Assembleia de Freguesia dirigido a este Tribunal, têm o seguinte teor:
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