TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
432 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL apresentar um projeto de reorganização territorial das freguesias, que lhe está em aberto. E a recusa, expressa ou tácita, em participar não impede a prossecução e consecução dos objetivos legais, apenas impõe uma via alternativa (ainda que menos desejável, na ótica legislativa) de os alcançar. 10. Importa agora ajuizar da conformidade desta iniciativa referendária com o disposto na LORL, conexionando-o com o regime da Lei n.º 22/2012. Não sofre dúvida de que a questão objeto do referendo é “de relevante interesse local” (artigo 3.º, n.º 1, da LORL), não se verificando nenhuma das situações expressamente excluídas do âmbito de tal referendo ( cfr. o artigo 4.º do mesmo diploma). A pergunta, formulada com “objetividade, clareza e precisão”, admite uma resposta de sim ou não, res- posta, em qualquer caso, vinculativa para a pronúncia a emitir pela Assembleia Municipal de Barcelos nos termos do citado artigo 11.º da Lei n.º 22/2012 (cfr. o artigo 219.º, n.º 1, da LORL). Em termos de projeção da resposta na conduta futura da assembleia municipal, a pergunta vai central- mente dirigida a saber se este órgão deve ou não participar no procedimento de reorganização, “promovendo a agregação, fusão ou extinção” de qualquer das freguesias integrantes do Município de Barcelos. Mas essa questão não é diretamente colocada, sem mais, aparecendo interligada a um segmento anterior, no qual se interroga a concordância em que a Assembleia Municipal de Barcelos se pronuncie a favor da reorganização das freguesias. Note-se que não é simplesmente pedida uma manifestação de concordância ou não com a emissão de uma pronúncia, mas antes de uma pronúncia “a favor” da reorganização. Com essa precisão denotativa, a promoção ou não da agregação, fusão ou agregação de freguesias, constante da segunda parte da pergunta, ganha um significado que de outro modo não teria. Como o próprio termo verbal utilizado ( o gerúndio) conota, essa forma de participação é vista como um modo de manifestar concordância com a decisão primária de efetuar uma reorganização das freguesias. Uma posição contrária a esta opção legisla- tiva, maioritariamente resultante da resposta, implica que a Assembleia não promova a agregação, fusão ou extinção de freguesias. Dito de outro modo: uma posição a favor da reorganização das freguesias integra- das no Município de Barcelos é uma condição para que a Assembleia Municipal promova, nos termos da Lei n.º 22/2012, a agregação, fusão ou extinção de quaisquer freguesias. Uma decisão participativa só será tomada nesse pressuposto. A resposta, tenha ela o sentido que tiver, abarca unitariamente as duas faces da pergunta: um sim ou um não representa simultaneamente concordância ou discordância com a reorganiza- ção e com a participação do município nesse procedimento. Mas esta associação da participação a uma posição favorável à reorganização das freguesias faz com que a pergunta, quanto a essa participação, perca um tom valorativamente neutro, roubando espaço à manifesta- ção de uma posição favorável à participação, ainda que desfavorável à reorganização. Ao ligar a concordância com uma iniciativa própria de apresentação de um projeto concreto de reorganização à concordância com esta medida, a pergunta favorece uma resposta negativa, mesmo daqueles que se teriam pronunciado a favor dessa participação, se a pergunta lhes tivesse sido simplesmente formulada, sem condicionantes de teor valo- rativo. Não custa admitir, na verdade, que uma faixa dos cidadãos eleitores pudesse ser levada a optar por algo percecionado como o “menor dos males”, em face de uma decisão já definitivamente tomada, em forma legislativa, pelo órgão de soberania, com competência para tal, no sentido da reorganização das freguesias: o aproveitamento da possibilidade de participação para obviar a que ela, em concreto, possa ser levada a cabo sem ter devidamente em conta a realidade do Município de Barcelos. Em face do exposto, ganha fundamento a conclusão de que os termos da pergunta sugerem indireta- mente o sentido das respostas, mais precisamente, que eles induzem a uma resposta no sentido do “não”, em violação da segunda parte do n.º 2 do artigo 7.º da LORL. Essa intencionalidade subjacente está, aliás, em consonância com a posição tomada pela Assembleia Municipal de Barcelos, em moção aprovada na ses- são de 20 de abril de 2012, de repudiar o Decreto da Assembleia da República que veio a dar origem à Lei n.º 22/2012 (cfr. o considerando 22, I, da proposta).
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