TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012

431 acórdão n.º 384/12 8. Do enquadramento legal da pronúncia a emitir pela assembleia municipal resulta que ela representa muito mais do que o simples exercício do direito de audição em sede de procedimento legislativo. De facto, aquele órgão autárquico não é confrontado com um concreto projeto de reorganização admi- nistrativa, com uma configuração acabadamente predefinida, em face do qual lhe incumbisse apenas expri- mir o seu parecer. À assembleia municipal é antes requerida uma participação ativamente constitutiva da reorganização das freguesias integrantes do respetivo município. A Lei n.º 22/2012 limita-se a delinear, em termos gerais e abstratos, “os objetivos, os princípios e os parâmetros” que devem reger essa tarefa de reorga- nização, em concreto. E entre esses princípios avulta, precisamente, o da «participação das autarquias locais na concretização da reorganização administrativa dos respetivos territórios» [alínea b) do artigo 3.º]. A tal participação cabe, mesmo, um papel central na definição do figurino último da reorganização a levar a cabo. Na verdade, à Unidade Técnica para a Reorganização Administrativa do Território, criada nos termos do artigo 13.º, n.º 1, compete apenas um controlo de legalidade das propostas apresentadas pelas autarquias, nas suas pronúncias [alínea c) do n.º 1 do artigo 14.º]. Só em caso de ausência de pronúncia das assembleias municipais ou de desconformidade das emitidas é que lhe cabe, no primeiro caso, “apresentar à Assembleia da República propostas concretas de reorganização administrativa” [alínea a) do mesmo artigo], ou propor às assembleias municipais projetos de reorganização, no segundo [alínea d) ]. Quer dizer, a lei fixou vinculativamente os objetivos (inclusive quantitativos) a atingir, mas não preorde- nou os modos, em concreto, de os alcançar, deixando tal definição para a autonomia local. 9. Sendo mais do que o mero reconhecimento do direito de audição, a prevista participação das assem- bleias municipais no procedimento de reorganização administrativa territorial autárquica não pode, todavia, ser tida como objeto de uma injunção legal estritamente vinculativa. É certo que, de acordo com o quadro legal, essa participação integra-se constitutivamente no percurso formativo desse procedimento, dando corpo a uma das suas fases nucleares, que se projeta diretamente no resultado final. De fato, da elaboração, pela assembleia municipal, de um projeto concreto de reorganização virá a resultar, em caso de conformidade com os parâmetros estabelecidos na Lei n.º 22/2012, o novo mapa das freguesias em cada município (ainda que a decisão final caiba, naturalmente, à Assembleia da República). E a lei “quer” essa participação, decerto no entendimento de que só ela assegura que a satisfação dos objetivos legislativamente fixados seja alcançada sem lesão séria de interesses locais, de que os órgãos autárquicos são representantes e porta-vozes qualificados. Mas a mesma lei não deixa de prever realisticamente a hipótese de ausência de pronúncia das assembleias municipais, deferindo, nesse caso, competência à Unidade Técnica para “apresentar à Assembleia da Repú- blica propostas concretas de reorganização administrativa do território das freguesias” [artigo 14.º, n.º 1, alí- nea b) , da Lei n.º 22/2012]. Apenas desincentiva essa conduta omissiva, associando efeitos desfavoráveis para o município à não participação da assembleia municipal. Assim é que, por um lado, quando a competência para elaboração de um projeto concreto passa a caber à Unidade Técnica, a assembleia municipal perde a possibilidade de apresentar projeto alternativo [alínea b) do n.º 1 do artigo 14.º e artigo 15.º a contrario ], possibilidade, esta, ressalvada em caso de desconformidade da pronúncia emitida (n.º 3 do artigo 15.º). Por outro, impede que as freguesias que, nesse município, venham a ser criadas por agregação (em resultado da referida proposta da Unidade Técnica) beneficiem do aumento de comparticipação no Fundo de Financia- mento das Freguesias (artigo 10.º, n. os 4 e 5). Obstaculiza, ainda, que sejam considerados os pareceres sobre a reorganização administrativa territorial autárquica eventualmente apresentados pelas juntas de freguesia à assembleia municipal (artigos 11.º, n.º 4, e 12.º, in fine ). Por último, mas não menos relevante, a assembleia municipal perde a possibilidade de fundamentar uma redução até 20% inferior ao número global de fregue- sias a reduzir (artigo 7.º, n.º 1) e a possibilidade de aplicar proporções diferentes (artigo 7.º, n.º 2). Não obstante, a assembleia municipal conserva o poder discricionário de emitir, nos termos da lei, uma pronúncia sobre a reorganização do território das freguesias, ou de abster-se de o fazer, sujeitando-se então às consequências desvantajosas acima referidas. Essa é uma opção primária, de exercício ou não do direito de

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