TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012

42 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL são que os planos sectoriais do turismo, ainda que para serem refletidos em instrumentos urbanísticos e mesmo que vinculem somente as entidades públicas, necessariamente comportam. As opções neles tomadas preordenam, ou pelo menos condicionam, os instrumentos de gestão territorial que com tais planos secto- riais devam conformar-se ou compatibilizar-se. Por isso, há lugar a participação dos interessados desde que se tenha optado pela sua elaboração, mesmo que não se trate de um instrumento de gestão territorial cuja existência deva considerar-se constitucionalmente imposta. Além de ser o entendimento mais conforme ao texto da Constituição (“… e de quaisquer instrumentos de planeamento físico do território”), verificam-se relativamente a eles as razões que presidem à consagração da garantia constitucional. Por outro lado, como adverte Rui Medeiros ( Constituição Portuguesa Anotada , Tomo I, 2.ª edição p. 1337) ao contrário do que sucede noutros preceitos constitucionais, o n.º 5 do artigo 65.º não contém qualquer remissão para a lei, sendo antes diretamente aplicável, sem prejuízo da liberdade de conformação do legislador na concretização do modo como tal participação se formaliza. Quanto à segunda interrogação, a determinação do âmbito da participação dos interessados exige uma leitura do conceito de “elaboração” dos instrumentos de planeamento territorial adequada à teleologia do preceito constitucional, que não se identifica com o sentido do termo no regime infraconstitucional. É um direito de participação em sentido amplo, seja quanto à legitimidade dos interessados e ao motivo da parti- cipação, seja quanto ao objeto, abrangendo qualquer modificação substancial dos instrumentos de gestão do território a que se aplica (cfr. Rui Medeiros, loc. cit. , p. 1337; Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo , I, Coimbra, 2008, pp. 147 e 445). Este entendimento de que a garantia é mais extensa, relativamente aos atos da dinâmica dos instrumen- tos de gestão territorial, do que resultaria da identificação do conceito constitucionalmente relevante com o sentido infraconstitucional, só na aparência contraria o que se decidiu no Acórdão n.º 394/04 (cfr. também Acórdão n.º 436/04). Na verdade, o que estava em causa nessa jurisprudência eram normas ou dimensões normativas que se limitavam a repor em vigência instrumentos de ordenamento do território já caducados. Não se tratava de uma nova opção quanto ao ordenamento do território, mas de manter opções anteriores, presumivelmente já sujeitas à participação dos cidadãos. Ora, a providência legislativa agora em análise não pode deixar de ser considerada uma modificação substancial do Plano de Ordenamento do Turismo da Região Autónoma da Madeira, sendo esse critério material e não o da tipologia dos atos, o que corresponde à teleologia do preceito constitucional. É uma modificação substancial da regulamentação existente pelos seus efeitos jurídicos, isto é, pelo conteúdo das normas que suspende e pelo inerente resultado na conformação do ordenamento. O artigo 1.º do Decreto desvincula de qualquer limite quanto ao número de camas (a “unidade de medida” do peso da ocupação turística) na ilha do Porto Santo, o que é uma modificação de particular significado para o “desen- volvimento sustentável” relativamente a uma ilha de dimensão relativamente reduzida. Quanto à ilha da Madeira, embora mantendo o número global de camas turísticas previstas, abandona a sua repartição pelos diversos municípios, permitindo opções pela concentração em locais com maior procura, com o consequente aumento da pressão urbanística e sobrecarga de infraestruturas sobre essas partes da ilha e os inerentes riscos ambientais. E liberta da tipologia de empreendimentos turísticos prevista no Plano, que condicionava a ocu- pação e exploração admissível em parte do território, permitindo com caráter genérico o que com as normas “ suspensas” só seria consentido a título excecional e com especial justificação. E é também uma modificação substancial se considerarmos, como tem de ser considerada, a real natu- reza da medida, apesar do nomen com que se apresenta. Como já se deixou dito, sob a veste formal de sus- pensão parcial depara-se, na realidade das coisas e por força da duração da medida estabelecida no artigo 2.º do Decreto , uma verdadeira alteração do POT. A conformação do ordenamento do turismo no território da Região, se o Decreto entrar em vigor, passará a ser aquela que o Decreto lhe introduz até que o POT seja revisto. Introduz-se o mesmo efeito que resultaria da alteração do Plano quanto às normas suspensas. É certo que tais normas de execução do POT ficam num estado de vigência latente, porque não são imediatamente revogadas, mas segundo o programa legislativo resultante do artigo 2.º do Decreto, só retomarão vigência

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