TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012

41 acórdão n.º 387/12 no processo de determinação das escolhas. A esta extensão da discricionariedade da planificação urbanística deve corresponder uma disciplina rigorosa do procedimento administrativo. A este propósito, escreve M. S. Giannini que, “quanto mais a rede dos interesses for complexa, tanto mais o legislador deverá cuidar em urdir as fases do procedimento, de modo a permitir uma avaliação consciente dos interesses abrangidos”. Por seu lado, Schmitt Glaeser refere que, “quanto mais aumenta a variedade das alternativas de escolha, em presença das circunstâncias complexas, e quantas mais são as interdependências, tanto menos é admissível uma composição dos conflitos atra- vés de soluções intuitivas imediatas.» O pedido apresenta a violação deste direito através de uma argumentação segundo a qual a falta de explicitação das verificações de facto, ponderações e prognoses em que assentou o ato em análise impossibi- litaria o exercício deste direito qualificado de participação procedimental. Entende o Requerente, que pela falta de fundamentação da suspensão, “são inviabilizados os direitos de informação e, logo, de participação esclarecida dos cidadãos e estruturas representativas nos procedimentos e no controlo (prévio ou sucessivo) das escolhas feitas pelos poderes públicos competentes no âmbito do planeamento com incidência territorial. Não são pois acautelados os direitos de participação dos interessados nos termos requeridos pelos artigos 65. º, n.º 5, 66. º , n.º 2, in fine e 267.º, n. os 1 e 5, da Constituição”. O que se adiantou quanto à improcedência dessa argumentação relativamente à “falta de fundamenta- ção” retira base à consideração da questão por esta perspetiva (refira-se que a invocação dos n. os 1 e 5 do artigo 267. º estaria deslocada, face à natureza do ato). 11. Todavia, a questão da violação do referido parâmetro constitucional não deixa de colocar-se e de dever ser analisada pelo Tribunal, embora pelo ângulo estrito de vício do procedimento legislativo. Com efeito, como resulta da resposta da Assembleia Legislativa, houve consulta de entidades externas (artigo 83.º do Decreto Legislativo Regional n.º 43/2008/M), mas não se abriu o procedimento legislativo à participação dos cidadãos mediante uma fase de participação pública dos interessados. Ora, como dizem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , Vol. I, p. 840, em anotação a este preceito “(…) a Constituição visou alicerçar a democracia participativa no âmbito do planeamento territorial procurando estimular uma cidadania territorial indispensável à pros- secução das tarefas do Estado referentes ao correto ordenamento do território e desenvolvimento harmo- nioso [artigos 9.º/ e) e g) e 82.º/ d) , i) , l) e m) ] e à efetivação de direitos fundamentais (direito ao ambiente e qualidade de vida, direito ao património cultural, direito à paisagem, direito ao desenvolvimento susten- tado, direito das futuras gerações, direito à fruição cultural, direito à igualdade real entre portugueses). A cidadania territorial impõe-se ainda num domínio como o do planeamento urbanístico e territorial, onde o clientelismo, os « lobbies », os grupos de interesse, a corrupção, tendem a converter o território e a cidade num esquema de perequações económicas, não raro veiculadas por redes informais de influência. O direito de par- ticipação incide sobre a elaboração (e sobre a revisão) de todos os instrumentos de planeamento urbanístico e de planeamento físico do território e tem por beneficiários todos os cidadãos e organizações residentes ou sedeadas nas áreas correspondentes. Dado o âmbito dos interessados, o mecanismo de participação deve con- templar procedimentos adequados (debates públicos, audiências públicas, etc.) a uma eficaz participação”. Sendo esta a teleologia e a matriz do preceito constitucional, duas questões podem concretamente levantar-se na interpretação do n.º 5 do artigo 65.º da Constituição com repercussão no sentido da deci- são. A primeira consiste em saber se os planos sectoriais de incidência territorial estão também abrangidos por esta garantia de participação ou se ela se restringe aos instrumentos de planeamento a que se refere o n.º 4 do mesmo artigo 65.º A segunda consiste em saber se o direito de participação, referindo-se o texto ­ constitucional à “elaboração” dos instrumentos de gestão territorial, se estende a outros momentos ou figuras da dinâmica do planeamento. Quanto à primeira questão, a resposta não pode deixar de ser positiva. A participação dos interessados está constitucionalmente garantida em quaisquer instrumentos de planeamento físico do território, dimen-

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