TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
40 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Como já se reconheceu, dificilmente pode contestar-se que, ficando o POT parcialmente suspenso com a extensão pretendida e sem prazo certo, o Decreto introduz no ordenamento regional, na prática, efeitos semelhantes aos que resultariam da imediata alteração do Plano. Nem se objecte que a suspensão vigorará pelo prazo máximo de “cerca de um a dois anos”, tempo que se estima necessário para a revisão do Plano. Tal afirmação não tem base fáctica ou normativa, nem sequer podendo inferir-se de qualquer procedimento de revisão em curso. É certo que as normas se mantêm formalmente num estado de vigência latente. Mas, segundo o pro- grama legislativo, sem expectativa de retomarem eficácia. Sendo este o seu efeito substancial, não é desrazoá- vel afirmar que a providência legislativa tem a finalidade objectiva de alcançar uma alteração do regime sob a forma de suspensão parcial. Porém, a disfunção que se descortina é entre a solução adotada e o regime infraconstitucional de dinâ- mica dos instrumentos de planeamento. Não uma profunda incongruência da lei consigo mesma ou entre o uso do poder legislativo e os fins ou escopos especialmente fixados pela Constituição, o que arreda qualquer perspetiva de consideração da questão pelo ângulo, de muita duvidosa aceitação no controlo de constitucio- nalidade, do “desvio de poder legislativo”. Deste modo, podendo o legislador regional proceder à alteração do Plano de Ordenamento Turístico, não se afigura que a adoção de uma providência que alcança o mesmo resultado material, embora pela via da suspensão parcial, deva ser qualificada, só por essa desarmonia, como excessiva ou arbitrária. Forçoso é, porém, que o seu confronto com as exigências da Constituição, designadamente quanto à observância das garantias procedimentais, se analise em conformidade com o alcance efetivo da medida e não com a sua aparência. É ao que seguidamente se procede. 10. No n.º 5 do artigo 65.º, introduzido pela revisão constitucional de 1997, a Constituição passou a garantir a participação dos interessados “na elaboração dos instrumentos de planeamento urbanístico e de quaisquer outros instrumentos de planeamento físico do território”. Trata-se de um direito também inscrito na Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e do Urbanismo [artigo 5.º, alínea f ) , e artigo 21. º] e regulado no Decreto-Lei n.º 380/99 a propósito dos vários instrumentos de gestão territorial (cfr. o artigo 40.º, quanto aos planos sectoriais de incidência territorial, que é o que aqui interessa considerar). O “ envolvimento e participação dos cidadãos” está também previsto no n.º 2 do artigo 66.º, designadamente quando se trate [alínea b) ] de “ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correcta localização das actividades, um equilibrado desenvolvimento sócio-económico e a valorização da paisagem”. Trata-se de uma concretização, em sede de ordenamento do território, do princípio da democracia participativa proclamado no artigo 2.º da Constituição. Como diz Alves Correia ( Manual de Direito do Urbanismo , Vol. I, 4.ª edição, 2008), em considerações referidas aos atos de planeamento urbanístico, mas igualmente pertinentes quanto à justificação da exigência de participação noutros instrumentos de ordena- mento ou de incidência no planeamento físico do território: «(…) Se a participação dos interessados no procedimento de elaboração dos planos urbanísticos não pode dei- xar de encontrar também a sua justificação no apontado fundamento geral da participação dos cidadãos na organi- zação e atividade da Administração Pública, o certo é que existe um fundamento específico que reclama a existência de formas adequadas de participação dos interessados nos procedimentos de planificação territorial: consiste ele na necessidade de compensar a amplitude do poder discricionário que caracteriza a atividade de planificação com uma exigente e aprofundada participação dos interessados. [ ......] A principal característica dos procedimentos de planificação urbanística consiste, como já tivemos a oportu- nidade de observar, na vastidão e na complexidade do cenário dos interesses neles coenvolvidos. Isto comporta o exercício de um poder discricionário, cujo grau e espessura são diretamente proporcionais à variedade das alterna- tivas que se apresentam ao planificador, tanto na seleção dos interesses, como na composição sucessiva dos mesmos
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