TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
385 acórdão n.º 379/12 107. º fá-lo para as “penas aplicáveis ao crime de falsidade”, ao passo que o artigo 97.º prescreve que os agen- tes incorrem “nas penas aplicáveis ao crime de falsas declarações perante oficial público”. Em apreciação desta alteração, também do ponto de vista do seu alcance inovatório, o Acórdão n.º 340/05 relacionou-a pertinentemente com mudanças de sistematização e de enquadramento normativos, no âmbito do Código Penal, nos seguintes termos: «(…) O Código Penal de 1886 (em vigor à data da edição do artigo 107.º do Código do Notariado de 1967) continha, no Título III do Livro Segundo, um Capítulo VI – “Das falsidades”, onde se incriminavam as “declara- ções falsas” e que incluía as seguintes Secções: I – “Da falsidade de moeda, notas de bancos nacionais e de alguns títulos do Estado”; II – “Da falsificação de escritos”; III – “Da falsificação de selos, cunhos e marcas”; IV – “Dis- posição comum às secções antecedentes deste capítulo”; V – “Dos nomes, trajos, empregos e títulos supostos ou usurpados”; VI – “Do falso testemunho e outras falsas declarações perante a autoridade pública”. O Código Penal de 1982 eliminou o Capítulo antes designado por “Das falsidades” e procedeu a uma rearru- mação sistemática dos crimes que nele se incluíam. Passou, então, a distinguir entre, por um lado, aqueles crimes que – tal como os de falsificação de documentos, moeda, pesos e medidas – são considerados crimes contra valores e interesses da vida em sociedade (Capítulo II do Título IV) e, por outro, aqueles que são considerados “crimes contra a realização da justiça” e como tal incluídos no Título dos “crimes contra o Estado” (Capítulo III do Título V) . Entre estes últimos encontram-se, por exemplo, a falsidade de depoimento ou declarações, a que corresponde o atual artigo 359.º do Código Penal ou a falsidade de testemunho, prevista no artigo 360.º do mesmo Código, preceito para o qual a decisão recorrida, em juízo de interpretação de direito infraconstitucional que a este Tribunal não cabe sindicar, entendeu que o artigo 97.º do atual Código do Notariado remeteria. Ora, integrada neste contexto, como tem de sê-lo, facilmente se percebe que – como nota o Ministério Público na sua alegação – a diferença que, nesta parte, se constata entre a redação do artigo 107.º do Código do Notariado de 1967 e o artigo 97.º do atual Código do Notariado – recorde-se: a substituição da remissão para o crime de “ falsidade” pela remissão para o crime de “falsas declarações perante oficial público” – é “meramente consequencial das modificações sistemáticas introduzidas no Código Penal”, visando simplesmente adequar aquele preceito do Código do Notariado à nova designação e arrumação sistemática do Código Penal de 1982». Falta saber, todavia, se esta presumida “simples adequação” foi ou não efetuada em termos de salva- guardar as exigências constitucionais decorrentes do princípio da legalidade e da reserva de competência legislativa da Assembleia da República. 8. A remissão, na formulação originária, para o crime de falsidade, dado o caráter genérico da desig- nação, já suscitava dúvida quanto à norma para que o artigo 107.º do Código do Notariado reenviava, na determinação da pena aplicável. Fazia parte do Código Penal de 1886, como se viu, um capítulo intitulado “ Das falsidades”. Desse capítulo constava uma secção (secção II), prevendo (artigo 216.º) o crime de “falsifi- cação de documentos autênticos ou que fazem prova plena”. O n.º 3 desta norma determinava a condenação de quem cometer falsificação «fazendo falsa declaração de qualquer facto, que os mesmos documentos têm por fim certificar e autenticar, ou que é essencial para a validade desses documentos». Integrada no mesmo capítulo, a secção VI dispunha sobre o “falso testemunho e outras falsas declarações perante a autoridade pública”. Dela fazia parte o artigo 242.º, prevendo o crime de “falso testemunho em inquirição não conten- ciosa. Falsas declarações perante a autoridade”. Esta dualidade de previsões, a do n.º 3 do artigo 216.º e a do artigo 242.º, espelhava normativamente a distinção entre falsificação (intelectual) de documentos e falsas declarações. A distinção reveste-se de extrema dificuldade, sobretudo quando, como é o caso, as falsas declarações são incorporadas em documento autên- tico – cfr. Helena Moniz, O crime de falsificação de documentos. Da falsificação intelectual e da falsidade em documento, Coimbra, 1993, p. 214. Para Maia Gonçalves ( Código Penal Português , 3. ª edição, Coimbra, 1977, p. 380), «há falsidade intelectual quando o documento é genuíno; não foi alterado, mas, contudo, não
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