TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012

379 acórdão n.º 377/12 ao interesse da satisfação das necessidades coletivamente sentidas pela classe profissional. É um dever que se impõe a todos os profissionais que a exerçam, sempre que assumam a responsabilidade pela contabili- dade de uma entidade, tendo o seu incumprimento uma pesada consequência que afetará todos quantos o incumpram. A meu ver, o “conteúdo profissional” da norma, bem como o seu caráter de norma reguladora da relação profissional, não se perde pelo facto de este dever recíproco ser instituído quando está em causa a sucessão num serviço prestado a um terceiro, a sociedade que procura os serviços de contabilidade. Ora, não pode deixar de se considerar que representa um expressivo condicionalismo do exercício da profissão impor aos técnicos oficiais de contas, quando assumam a responsabilidade por contabilidades ante- riormente a cargo de outro técnico oficial de contas, um dever de se certificarem que os valores provenientes da sua execução estão inteiramente satisfeitos ao técnico oficial de contas cessante, com a consequência, for- temente penalizadora, em caso de incumprimento, de se assumirem perante este pelos montantes não pagos. Ao procurar proteger os profissionais que cessam funções, do incumprimento do dever imposto, a norma associa, de modo automático, uma consequência penalizadora, com intuito inibidor. Acresce que a inobservância deste dever de se certificarem de que se encontram pagos aos colegas ces- santes todos os valores devidos, que tem a consequência de se assumirem perante o colega por montantes em falta, pode, ainda, acarretar a aplicação, pela própria associação profissional, da sanção disciplinar de suspensão. Nestes moldes, a norma em causa define, inovatoriamente, um dever de conduta profissional dos técni- cos oficiais de contas, relevante na sua relação com colegas, que não poderemos deixar de considerar muito significativo, quer, atendendo à consequência automaticamente derivada do seu não cumprimento, quer, tendo (também) em conta as potenciais consequências disciplinares do seu incumprimento (artigo 66.º).  Tal norma cria, por essa razão, uma limitação à liberdade de exercício de profissão constitucionalmente garantida no artigo 47.º, n.º 1, da Constituição: ao exercício da profissão pelos técnicos oficiais de contas é imposto um condicionalismo, traduzido num dever de conduta previsto para salvaguarda de colegas, cuja inobservância tem consequências significativas, e que pode mesmo conduzir, em certas condições, à aplica- ção, pela própria associação, de sanção disciplinar de suspensão de exercício da profissão. Assim, a definição, na sua essência, deste condicionalismo, contendendo com matéria de direitos, liber- dades e garantias, enquadra-se no âmbito da competência legislativa reservada da Assembleia da República, pelo que carecia de credencial legislativa, nos termos definidos no artigo 165.º, n.º 1, alínea b) , com referên- cia ao artigo 47.º, n.º 1, ambos da Constituição da República Portuguesa, e só com autorização parlamentar estaria o Governo legitimado a emiti-la. – Catarina Sarmento e Castro. Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República , II Série, de 21 de setembro de 2012. 2 – Os Acórdãos n. os 29/00 e 128/00 estão publicados em Acórdãos , 46. º Vol.. 3 – O Acórdão n.º  255/02 está publicado em Acórdãos , 53. º Vol..

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