TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012

378 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Em minha opinião, constitui matéria incluída no âmbito da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República a definição dos deveres de conduta a que ficam adstritos os associados das asso- ciações profissionais, pelo menos na delimitação do seu conteúdo essencial, no caso dos deveres que, como o aqui em causa, marcam muito significativamente o exercício da profissão, impondo um condicionalismo com tão pesada consequência, sendo claramente marcante do exercício profissional. 3. A (então) Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas é uma associação pública profissional, com a competência de “representar, mediante inscrição obrigatória, os interesses profissionais dos técnicos oficiais de contas e superintender em todos os aspetos relacionados com o exercício das suas funções.” (artigo 1.º do aludido Estatuto). A institucionalização de Ordens profissionais “corresponde ao aproveitamento pelo Estado da tendência inerente a toda a associação profissional de regular o acesso à profissão, de definir os padrões de exercício e conduta profissional e de punir as infrações à disciplina profissional (…). Na realidade, as associações profissionais são “organismos administrativos em potência” (Schuppert, apud Vital Moreira, Autorregulação Profissional e Administração Pública , Almedina, 1997, p. 261). De facto, por estarem incumbidas de tarefas administrativas, dessa forma participando no poder público, inserem-se as associações públicas no âmbito da “administração autónoma”, conceito traduzível na “ administração de interesses públicos, próprios de certas coletividades ou agrupamentos infraestaduais (de natureza territorial, profissional ou outra), por meio de corporações de direito público ou outras formas de organização representativa, dotadas de poderes administrativos, que exercem sob responsabilidade própria, sem sujeição a um poder de direção ou de superintendência do Estado nem a formas de tutela de mérito” ( Vital Moreira, Administração Autónoma e Associações Públicas , Coimbra Editora, 1997, p. 79). O reconhecimento das associações públicas como parte integrante da estrutura da Administração ocor- reu, no texto da Lei Fundamental, com a revisão constitucional de 1982, passando o dispor o artigo 267.º, n.º 3 (hoje, n.º 4) da Constituição da República Portuguesa, o seguinte: «3. As associações públicas só podem ser constituídas para a satisfação de necessidades específicas, não podem exercer funções próprias das associações sindicais e têm organização interna baseada no respeito dos direitos dos seus membros e na formação democrática dos seus órgãos.» Ficaram assim estabelecidos alguns princípios materiais, a que devem estar subordinadas as associações públicas, nomeadamente de natureza profissional, e que podem ser sintetizados nos termos seguintes: 1) a vinculação da respetiva constituição ao interesse funcional de satisfação de necessidades específi- cas de conformação publicística da profissão, como corolário dum princípio de proporcionalidade ( traduzido na correspondência entre a medida das limitações inerentes à liberdade de associação e os benefícios advenientes da organização pública); 2) proibição do exercício de funções sindicais; 3) respeito pelos direitos dos membros; 4) formação democrática dos órgãos respetivos (cfr. Jorge Miranda, “O regime das associações públi- cas”, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, vol. XXVII, 1986, pp. 80, 81; Parecer da Comissão Constitucional n.º 2/78, Vol. 4, Imprensa Nacional-Casa da Moeda (INCM), 1979, pp. 151 e segs.). 4. A norma em causa cria um dever – e estipula a consequência para o seu não cumprimento – para satisfazer exigências conexionadas com o associativismo de tipo profissional: a norma em apreço impôs ao exercício da profissão de técnico oficial de contas um dever de conduta em face dos colegas. Tal dever é simultaneamente imposto em virtude do exercício da profissão em causa e da participação numa determi- nada organização profissional – i. e. , a conformação do exercício da profissão é funcionalizada, entre outros,

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