TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
369 acórdão n.º 360/12 requerente do pedido de extradição não está neste processo numa posição de confronto processual relativa- mente àquele Estado. Não está investido num qualquer papel de participante (parte) processual, relativa- mente ao qual se possa concluir que foi proferida uma decisão contra ou a favor dele, uma decisão que direta e efetivamente o prejudique, porque a isso sempre obstaria a natureza jurídica da extradição, uma forma de cooperação judiciária internacional em matéria penal entre Estados soberanos. Entendimento que é também amparado pelo artigo 7.º, n.º 1, da CRP, quando, em matéria de relações internacionais, dispõe que Portugal se rege, entre outros princípios de direito internacional, pelos princípios da igualdade entre Estados e da não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados. A decisão judicial que resolva a autorização de extradição, nomeadamente por violação do princípio da especialidade, deverá ser tida apenas como um elemento, entre outros, que o Estado requerido leva em con- sideração quando pondera politicamente a atitude a tomar no plano das relações com o Estado requerente. Não poderá, pois, ter o alcance de decisão que, por si só, desencadeie a consequência da violação do princípio da especialidade, valendo como decisão contra o Estado requerente, como decisão que direta e efetivamente o prejudique. Tanto mais que, diferentemente do que sucede na fase judicial do processo de extradição, necessariamente antecedida de uma decisão administrativa no sentido do deferimento do pedido de extradi- ção, ainda não foi tomada qualquer decisão de base eminentemente política, sendo certo que a violação do princípio da especialidade tem repercussões diretas no plano das relações entre os Estados envolvidos, já que o princípio protege também, de forma autónoma, a soberania do Estado requerido. 9. O que acaba se der dito está em consonância com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de dezembro de 2007, que decidindo embora no sentido de a ordem jurídica interna dever tomar posição sobre a alegada violação do princípio da especialidade, conclui que a declaração de resolução de autorização con- cedida deveria “depois ser encaminhada para as instâncias do poder político, através da autoridade central, a fim de, pela via diplomática, o Estado Português tomar a atitude que for considerada mais conveniente” ( cfr. supra ponto 2. do Relatório). Bem como com o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14 de setembro de 2011 – a decisão judicial cuja irrecorribilidade decorre da norma em apreciação – que lhe deu cumprimento. Respondendo às duas questões que se propôs apreciar e decidir, este acórdão do Tribunal da Relação conclui que, à face do ordenamento jurídico português, a União Indiana violou o princípio da especialidade consagrado no artigo 16.º da Lei n.º 144/99 (fl. 587); e que, não prevendo embora esta Lei, em termos gerais, qualquer consequência específica para a violação do princípio da especialidade por parte do Estado requerente da extradição, tal não obsta a que, em caso de violação, o Estado português não possa vir a reagir pela via político-diplomática, para o que será relevante o juízo formulado pelas instâncias judiciárias portu- guesas. Além de o Estado português poder vir a suscitar a intervenção de instâncias de jurisdição internacio- nal e de poder extrair do caso as devidas consequências políticas. Isto é: não obstante ter considerado ilegal o julgamento pelos novos crimes e de ter decidido resolver a autorização concedida para a extradição de A., a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa conclui somente pela violação do princípio da especialidade. Não obriga, por si só, o Estado requerente à prática de determinado comportamento, designadamente o de devolver o extraditado, não sendo, por isso, uma decisão proferida contra a União Indiana, uma decisão que direta e efetivamente a prejudique. Da resposta à questão de saber qual a consequência da violação do princí- pio da especialidade à luz do direito português, decorre que caberá ao Estado português – e não às instâncias judiciárias portuguesas – decidir tal consequência, o que já terá a ver com o plano político-diplomático das relações entre os dois Estados soberanos. 10. Face ao que vem de ser dito, na medida em que a decisão cuja recorribilidade está em causa não é uma decisão contra a União Indiana, não é uma decisão que direta e efetivamente prejudique este Estado, é de concluir que a norma em apreciação não viola o direito ao duplo grau de jurisdição. Está fora do âmbito de proteção do direito de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20.º da CRP, bem como do princípio da
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=