TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
364 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 2. Decorre do requerimento de interposição de recurso e das alegações produzidas que a recorrente con- sidera que a primeira norma viola o princípio do Estado de direito, o princípio da interpretação conforme a Constituição, o princípio da tutela jurisdicional efetiva, o princípio do fair trial e o princípio da igualdade de armas, vertidos nos artigos 2.º, 18.º, n. os 1 e 2, e 20.º, n.º 4, da Constituição da República Português ( CRP), bem como no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem; e que a segunda norma viola os princípios da boa-fé, da confiança e da segurança jurídica, inerentes ao Estado de direito e corolários do princípio da tutela jurisdicional efetiva e do direito a um processo justo e equitativo, vertidos nos artigos 2. º e 20.º, n.º 4, da CRP, bem como no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Como o requerimento de interposição de recurso é a peça processual que delimita o respetivo objeto, é de concluir que a recorrente abandonou a questão de saber se aquelas normas também violam os artigos 7.º, n.º 1, e 32.º, n.º 1, da CRP, questões que suscitou durante o processo (fl. 387 e segs.). O artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem é indicado no requerimento de interpo- sição de recurso, não o tendo sido quando foi questionada a constitucionalidade daquelas normas durante o processo (fls. 387 e segs.). Deve entender-se, porém, que tal não significa que a recorrente esteja a pôr uma questão de constitucionalidade diferente da que é posta por referência ao artigo 20.º, n.º 4, da CRP, uma vez que aquela disposição convencional é convocada apenas como um outro fundamento normativo do direito a um processo justo e equitativo (ou a um fair trial ). Sendo que o disposto no artigo 6.º, n.º 1, daquela Con- venção, “consagrando o direito dos cidadãos a que a sua causa seja examinada «equitativa e publicamente», « num prazo razoável», «por um tribunal independente e imparcial» não confere direitos diversos ou mais extensos do que os previstos na nossa Constituição, maxime no seu artigo 20.º”, o que faz com que não se justifique apreciar a eventual desconformidade entre a norma de direito interno e as disposições da Con- venção (cfr. Acórdão n.º 632/99, disponível em www.tribunalconstitucional.pt , num entendimento que tem vindo a ser reiterado pelo Tribunal). Por outro lado, o artigo 18.º, n. os 1 e 2, da CRP é convocado no requerimento de interposição de recurso para questionar a constitucionalidade da primeira norma, não o tendo sido durante o processo (fl. 387 e segs.). É convocado enquanto disposição constitucional que consagra o princípio da interpretação conforme à Constituição (cfr. fl. 445 dos presentes autos, pontos 101. e segs. das alegações e conclusão 15.), princípio que não é, porém, parâmetro de aferição da constitucionalidade de normas. O princípio da inter- pretação conforme à Constituição é tão-só um princípio geral de interpretação, “um instrumento herme- nêutico de conhecimento das normas constitucionais que impõe o recurso a estas para determinar e apreciar o conteúdo intrínseco da lei” (Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição , Almedina, p. 1310). Apesar de a recorrente apelar ao artigo 18.º, n. os 1 e 2, da CRP, enquanto disposição que consagra o princípio da interpretação conforme à Constituição, tal não pode equivaler ao pedido de apreciação de uma questão constitucionalidade normativa, na medida em que não é por referência à norma em si que conclui pela violação do princípio, mas sim por referência ao modo como o tribunal recorrido interpretou os precei- tos legais pertinentes. Segundo a recorrente, perante duas interpretações possíveis das disposições conjugadas dos artigos 47.º, n.º 4, e 58.º, n.º 1, da Lei n.º 144/99 e 401.º, n.º 1, alínea d) , do CPP, o Supremo Tribu- nal de Justiça optou por uma interpretação que não é conforme à Constituição. Por, no seu entender, tal dimensão interpretativa ser violadora do direito de acesso aos tribunais, bem como dos princípios da tutela jurisdicional efetiva, do fair trial e da igualdade de armas (cfr. pontos 103. a 105. das alegações). É, por isso, irrelevante que, durante o processo, a recorrente não tenha convocado aquele princípio. 3. A recorrente alega que a «norma extraída dos artigos 47.º, n.º 4, e 58.º, n.º 1, da Lei n.º 144/99, de 31 de agosto, e do artigo 401.º, n.º 1, alínea d) , do Código de Processo Penal, segundo a qual não tem legitimidade para recorrer de uma decisão condenatória que afeta os seus direitos o Estado requerente de um processo de extradição já depois da entrega do Extraditado às autoridades desse mesmo Estado» viola o princípio da tutela jurisdicional efetiva, corolário direto da ideia de Estado de direito, de onde faz decorrer o direito ao duplo grau de jurisdição, uma das expressões do direito de acesso aos tribunais. E viola também
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