TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
355 acórdão n.º 360/12 A posição do Estado requerente à luz do preceito em causa é a de cooperar e não dificultar o andamento dos autos, tal como resulta do segmento normativo retrocitado, restringindo a sua esfera interventiva à de trazer ao tribunal os elementos de que careça dentro desse espírito de colaboração. Uma posição, pois, de subalternidade em relação ao requerido e ao Estado requerido. Na Exposição de Motivos da Proposta de Lei 251/VII (p. 1224), que esteve na origem da Lei n.º 144/99, afirma-se que: “ Nos artigos 47.º e 69.º prevê-se a representação do Estado requerente no processo de extradição, figura até aqui desconhecida do processo extradicional português, mas conhecida de legislações de outros países, como é o caso de Espanha. Trata-se de um mecanismo assente na reciprocidade, que possibilitará o acompanhamento mais direto do processo por aquele Estado e o fornecimento de informações solicitadas pelo tribunal, assim se refletindo também preocupações de maior celeridade e eficácia desta cooperação”. O artigo 14.º da Lei 4/1985 (Lei da Extradição Passiva) do Reino de Espanha (hoje com a redação da Lei 13/2009, de 3 de novembro), diz apenas o seguinte: 1. Dentro de los quince dias seguintes al período de instrucción, el Secretario judicial señalará la vista que tendrá lugar con intervención del Fiscal, del reclamado de extradición, asistido, si fuera necesario, de intérprete y del Abogado defensor. En la vista podrá intervenir, y a tal efecto será citado, el representante del Estado requirente cuando así lo hubiere solicitado y el Tribunal lo acuerde atendido el principio de reciprocidad, a cuyo fin reclamará, en su caso, la garantía necesaria a través del Ministerio de Justicia . A regulamentação mais desenvolvida desta matéria encontra-se no CPP italiano (logo na redação originária, de 1988), que nos seus artigos 702.º e 706.º dispõem o seguinte: Artigo 702.º – Intervenção do Estado requerente 1. Sob condição de reciprocidade, o Estado requerente tem a faculdade de intervir no processo perante o tri- bunal de recurso (Corte d’Appello) e o tribunal de cassação (Corte do Cassazione) fazendo-se representar por um advogado habilitado para o patrocínio perante as autoridades judiciárias italianas. Artigo 706.º – Recurso de Cassação 1. Contra a sentença do tribunal de recurso pode ser interposto recurso de cassação, também quanto ao mérito, pela pessoa interessada; pelo seu defensor, pelo procurador geral e pelo representante do Estado requerente. Ora, o legislador português, que conhecia o modelo italiano, afastou-se claramente dele como resulta clara- mente do teor dos artigos 47.º, n.º 4, e 58.º. Por outro lado a União Indiana ao requerer a extradição de A. não podia ignorar o direito interno português em matéria de extradição atribuindo-lhe aquele estatuto e, do mesmo modo que é da praxis em matéria de direito internacional penal o princípio do não inquérito, proibindo que no Estado requerido se questione a justeza do direito processual penal do Estado requerente (cfr. decisão do Supremo Tribunal de Justiça do Canadá, P.º Canadá vs Schmidt, 1987, 1 SCR500), também a regra da reciprocidade, por razão idêntica, implica que o Estado reque- rente não questione as regras de direito processual inerentes ao âmbito e limites de intervenção consentido no processo de acordo com a nossa lei adjetiva. Mas a norma do artigo 58.º da Lei n.º 144/99, de 31/8, rege, apenas, para o recurso da decisão final ordenando a extradição, é, porém, omisso quanto à admissibilidade dos recursos interpostos após essa fase processual, mas se a lei é bem expressa em vedar a legitimidade ao Estado requerente da decisão ordenando a extradição, por maioria de razão, manda a lógica, enquanto elemento interpretativo da lei (artigo 9.º, do CC) que essa proibição se imponha quanto a decisões da Relação proferidas após aquela fase, visto não respeitarem àquela fase crucial do processo. Não há qualquer razão, de um ponto lógico-racional, sob pena de se cair em insanável contradição, que o legis- lador tenha vedado ao Estado requerente recorrer da decisão final, que é o ato processual por excelência e, depois, com relação a uma decisão interlocutória, incidental, o venha permitir, não fazendo sentido afirmar-se, como o faz a União Indiana, para justificar o apelo ao CPP como lei subsidiária, que se está numa fase posterior à entrega, de natureza não judicial.
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