TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012

347 acórdão n.º 350/12 ­ exposição de motivos do diploma preambular) e que se pretendeu potenciar através de diversos fatores atinentes quer à estrutura do processo quer à própria tramitação processual, e, neste caso, por via, designa- damente, da supressão da duplicação do chamamento de credores ao processo, que agora se concentra numa única fase de citação com vista à reclamação dos respetivos créditos (artigos 37.º e 128.º e segs.). Como se viu, a exigência de indicação dos cinco maiores credores no articulado de oposição do devedor tem justamente em vista permitir a identificação daqueles que, na sequência da prolação da sentença de declaração de insolvência, devam ser citados pessoalmente ou por carta registada para efeito de exercerem o direito de reclamarem os seus créditos. Ao processo de insolvência, ainda que integre o domínio mais geral do processo civil, não pode deixar de reconhecer-se uma certa especificidade, que justificou que a sua regulamentação fosse retirada do Código de Processo Civil, onde tradicionalmente se inseria, e coligida num diploma autónomo, através da aprovação, pelo Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de abril, do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, depois substituído pelo atual Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. Não se põe em dúvida que o legislador dispõe de uma ampla margem de livre conformação para, com base em razões de política legislativa que lhe cabe definir, modelar uma forma de processo que permita dar satisfação, de modo célere e eficaz, aos direitos dos credores. Também não se questiona que o ónus processual imposto ao devedor quando pretenda deduzir opo- sição ao requerimento de declaração de situação de insolvência – por via da falada norma do artigo 30.º, n.º 2, do CIRE – , não suscita especiais dificuldades de cumprimento, visto que o devedor, pela sua própria condição de sujeito processual passivo, não pode deixar de conhecer os factos relevantes relativos à sua situa- ção patrimonial e está particularmente habilitado a fornecer os elementos de informação que interessam ao prosseguimento do processo. A solução normativa, tal como se conclui no Acórdão n.º 556/08, é suscetível de violar o princípio do processo equitativo, não tanto pelo maior ou menor grau de dificuldade que o cumprimento do ónus pudesse suscitar, mas pelo caráter excessivo da cominação que lhe está associada, quando entretanto nem sequer se admite a possibilidade de suprimento da deficiência do articulado. De facto, o n.º 2 do artigo 30.º do CIRE estabelece um mero requisito formal que se destina a facilitar a identificação pelo tribunal dos credores que devam ser citados pessoalmente ou por carta registada, tendo por isso uma mera função instrumental relativamente ao ulterior desenvolvimento da tramitação processual, em nada interferindo com a substanciação dos factos ou fundamentos jurídicos que possam a relevar para o sentido da decisão a proferir quanto à declaração de insolvência. Apesar disso, o não cumprimento desse ónus acarreta o não recebimento do articulado e produz um efeito de revelia correspondente à não apresentação de oposição, implicando que se considerem confessados os factos alegados na petição inicial, e que a insolvência possa declarada no dia útil seguinte ao termo do prazo para deduzir a oposição (artigo 30.º, n.º 5). A sentença de declaração de insolvência representa um momento fulcral do processo, que se não limita a conformar a tramitação posterior – com consequências no plano da apreensão de bens, reclamação de créditos, liquidação da massa insolvente, verificação e graduação dos créditos e pagamento dos credores – , mas constitui também uma fonte de importantes efeitos, desde logo sobre o devedor, o principal dos quais é a privação dos poderes de administração e disposição dos bens integrantes da massa insolvente. A atribuição de tais consequências a uma mera deficiência formal do articulado, sem que ao interessado seja dada sequer oportunidade de aperfeiçoamento, é manifestamente desproporcionada, tanto que o opo- nente pode ter entretanto alegado e provado factos que pudessem conduzir a um juízo de inexistência da situação de insolvência. Além de que a solução legal gera uma manifesta situação de desigualdade entre as partes no processo, já que idêntica falta em que tenha incorrido o requerente não impede, nos termos previstos no artigo 27.º, n.º 1, alínea b ), do CIRE, que este possa corrigir a irregularidade dentro do prazo que lhe é cominado para o efeito.

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