TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
327 acórdão n.º 348/12 A disposição legal a que se reporta a norma que constitui objeto do presente recurso tem a seguinte redação (entretanto modificada pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro): « Artigo 4.º Isenções 1 – Estão isentos de custas: (...) h) Os trabalhadores ou familiares, em matéria de direito do trabalho, quando sejam representados pelo Minis- tério Público ou pelos serviços jurídicos do sindicato, quando sejam gratuitos para o trabalhador, desde que o respetivo rendimento ilíquido à data da proposição da ação ou incidente ou, quando seja aplicável, à data do despedimento, não seja superior a 200 unidades de conta, quando tenham recorrido previamente a uma estrutura de resolução de litígios, salvo no caso previsto no n.º 4 do artigo 437.º do Código do Trabalho e situações análogas.» 2. O Tribunal recorrido recusou a aplicação daquela norma, com fundamento em inconstitucionali- dade, por violação dos princípios constitucionais da igualdade e da justa reparação dos acidentes de trabalho, consagrados nos artigos 13.º, e 59.º, n.º 1, alínea f ), da Constituição da República Portuguesa (CRP). Segundo a decisão recorrida, o direito à reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho é um direito absolutamente irrenunciável e de exercício necessário, tendo curso oficioso e natureza urgente os pro- cessos em que se discute este direito (artigos 1.º, n.º 1, e 34.º da Lei n.º 100/97, de 13 de setembro – Regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais, revogado pela Lei n.º 98/2009, de 4 de setem- bro – e 117.º, n.º 1, alínea a) , e 119.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho). Este regime substantivo e processual decorre do artigo 59.º, n.º 1, alínea f ) , da CRP, o qual deve ser objeto de uma valoração que atenda à natureza indisponível do direito em causa, importando interpretar o artigo 4.º, n.º 1, alínea h) , do Regulamento das Custas Processuais neste contexto. 3. Com a revisão constitucional de 1997 foi aditado ao n.º 1 do artigo 59.º da CRP o direito de todos os trabalhadores a justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho [alínea f ) desta disposição legal]. E foi já sublinhado por este Tribunal, que tal direito se reveste de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias (Acórdão n.º 612/08, disponível em www.tribunalconstitucional.pt . Assim também, na doutrina, Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , Coimbra Editora, 2007, anotação ao artigo 59.º, ponto I., e Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Wolters Kluwer/Coimbra Editora, 2010, anotação ao artigo 59.º, ponto XVIII). A consagração constitucional daquele direito «não só habilita o legislador a adotar políticas legislativas orientadas à proteção dos direitos do trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho (…), como impõe ao Estado a criação de instrumentos que assegurem (…) uma justa remuneração aos trabalhadores em causa» ( Jorge Miranda/Rui Medeiros, ob. cit., anotação ao artigo 59.º, ponto XVIII). Ora, não se vê como é que a isenção de custas nas ações emergentes de acidente de trabalho em que os sinistrados sejam representados pelo Ministério Público possa ser tida como instrumento que assegure a justa reparação a estes trabalhado- res. Juízo que – diferentemente do que parece resultar da decisão recorrida – não deverá ser feito a partir do direito infraconstitucional, valorando a sua maior ou menor coerência. Face ao direito anterior, em que a isenção abrangia todos os sinistrados em acidente de trabalho nas causas emergentes do acidente que fossem representados ou patrocinados pelo Ministério Público [alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º do Código das Custas Judiciais, na redação resultante do Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de dezembro], o Tribunal justificou tal generalização da isenção, não por a norma constitucional a impor, mas por invocação de uma outra razão:
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