TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
316 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Como dizem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada , Vol. I, 4.ª edição, 2007, «A fórmula do n.º 1 é, sobretudo, uma expressão condensada de todas as normas restantes deste artigo, que todas elas são, em última análise, garantias de defesa. Todavia, este preceito intro- dutório serve também de cláusula geral englobadora de todas as garantias que, embora não explicitadas nos números seguintes, hajam de decorrer do princípio da proteção global e completa dos direitos de defesa do arguido em processo criminal. Em “todas as garantias de defesa” engloba-se indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acu- sação. Dada a radical desigualdade material de partida entre a acusação (normalmente apoiada no poder institucional do Estado) e a defesa, só a compensação desta, mediante específicas garantias, pode atenuar essa desigualdade de armas. Este preceito pode, portanto, ser fonte autónoma de garantias de defesa. Em suma, a «orientação para a defesa» do processo penal revela que ele não pode ser neutro em relação aos direitos fundamentais (um processo em si, alheio aos direitos do arguido), antes tem neles um limite infrangível». É por referência a este significado constitucional, de um processo penal orientado para a defesa em que ao arguido não sejam colocados entraves a que possa defender a sua posição e contrariar a acusação e atacar a sentença condenatória, em matéria de direito e de facto, que há de ser perspetivado o problema das reper- cussões das diligências necessárias a obter a reprodução dos registos de prova no prazo de recurso. O que a garantia constitucional exige é que o arguido não seja posto, em termos de disponibilidade de elementos, de tempo e de circunstâncias em que tais elementos lhe são fornecidos, em situação que lhe não permita uma opção esclarecida e eficaz quanto ao âmbito da impugnação da decisão condenatória (ou à defesa da decisão absolutória). Não decorre dela a incolumidade dos prazos fixados pela lei ordinária. O que o arguido não pode é ficar privado de obter os elementos que entenda necessários, permanecer na incerteza acerca do momento em que lhe serão fornecidos ou a disponibilização destes consumir parte substancial do prazo, de modo que este deixe de ser idóneo para uma opção e preparação refletida da motivação do recurso. Ora, a norma em causa, na interpretação adotada pelo despacho recorrido sobre cujo aresto não cabe a este Tribunal emitir pronúncia no plano do direito ordinário, tem por consequência, confirmar em 2 dias, no máximo, o tempo disponível pelo arguido para preparar a motivação, efeito este que não pode julgar-se demasiado oneroso. Deste modo, face aos atuais prazos de recurso em processo penal e ao regime de disponibilização de cópia dos registos de prova gravada, que consomem, na pior das hipóteses 2 dias desse prazo, não pode con- cluir-se que a norma da alínea b ) do n.º 1 do artigo 411.º do CPP, interpretada no sentido de que “o prazo para a interposição de recurso, onde se impugne a decisão da matéria de facto cujas provas produzidas em sede de audiência tenham sido gravadas, [se conta] sempre a partir da data do depósito da sentença na secre- taria, e não a partir da data da disponibilização ao arguido dos suportes materiais da prova gravada, ainda que estes tenham sido diligente e tempestivamente requeridas por este último – por as considerar essenciais para o cabal exercício do direito de defesa mediante recurso –, se diligentemente facultados pelo tribunal” viole a exigência de que o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso. 6. Decisão Pelo exposto, decide-se negar provimento ao recurso e condenar os recorrentes nas custas, com 25 uni- dades de conta de taxa de justiça. Lisboa, 27 de junho de 2012. – Vítor Gomes – Maria Lúcia Amaral – Carlos Fernandes Cadilha – Ana Guerra Martins – Gil Galvão . Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República , II Série, de 16 de novembro de 2012. 2 – Os Acórdãos n. º 542/04 e 545/06 estão publicados em Acórdãos , 60. º e 66.º Vols., respetivamente.
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