TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012

301 acórdão n.º 319/12 O autor citado aponta mesmo como exemplo de concurso aparente um caso como este: “Circunstâncias como, p. ex., a de se utilizar arma proibida (…) constituem condutas que concorrem com a de homicídio, em princípio, sob a forma de concurso aparente” ( ob. cit. , página 1017). Não é, pois, correta a decisão recorrida no ponto em que autonomizou como crime do artigo 86.º, n.º 1, alínea c) , da Lei n.º 5/2006, o uso da arma, devendo o arguido ser absolvido da acusação nessa parte. A utilização de arma proibida relevará apenas na determinação da pena concreta do homicídio.” Pretende o recorrente que existe concurso aparente por a detenção ilegal de arma ter sido crime meio relativa- mente ao crime-fim, o homicídio e nele se ter esgotado. Refere o Ministério Público que como se depreende do doutamente decidido no último acórdão citado, o arguido recorrente cometeu efetivamente o crime de detenção de arma proibida na medida em que, para além do crime de homicídio praticado não ter sido qualificado pela arma, não se tratou de um ato instantâneo como o do citado acórdão, antes ponderado, pois o arguido foi comprar a arma, o que por si só autonomiza o crime de deten- ção de arma proibida e, nessa medida, crime autónomo do homicídio praticado com essa mesma arma. Também o Ac. STJ de 31.3.2011 no processo n.º 361/10.3 GBLLE [5] refere que : I. No presente recurso questiona-se a agravação prevista no n.º 3 do artigo 86.º da Lei 5/2006, de 23-02, em relação à pena do crime de homicídio, sendo certo que a agravação ali estabelecida só não terá lugar quando “ o porte ou uso de arma for elemento do respetivo tipo de crime ou a lei já previr agravação mais elevada para o crime, em função do uso ou porte de arma”. II. O uso ou porte de arma não é elemento do crime de homicídio, cujo tipo legal fundamental é o previsto no artigo 131.º do CP; pode ser um fator de agravação, mas só o será se, para além de preencher um dos exemplos-padrão “meio particularmente perigoso» ou «prática de um crime de perigo comum” da alínea h) do n.º 2 do artigo 132.º, revelar “especial censurabilidade ou perversidade”. Enquanto que a agravação do n.º 3 do artigo 86.º, encontrando fundamento num maior grau de ilicitude, tem sempre lugar se o crime for cometido com arma, a do artigo 132.º só operará se o uso de arma ocorrer em circunstâncias reveladoras de uma especial maior culpa. Além, para haver agravação, basta o uso de arma no cometimento do crime, aqui não. III. O n.º 3 do artigo 86.º só afasta a agravação nele prevista nos casos em que o uso ou porte de arma seja elemento do respetivo tipo de crime ou dê lugar, por outra via, a uma agravação mais elevada. A agravação do artigo 86.º, n.º 3, não é arredada ante a mera possibilidade de haver outra agravação, mas apenas se for de acionar efetivamente essa outra agravação. Ora, o uso de arma não é elemento do crime de homicídio, e, no caso, não levou ao preenchimento do tipo qualificado do artigo132.º, pelo que não há fundamento para afastar a agravação do artigo 86.º, n.º 3. IV. Outra questão é a de saber se o arguido cometeu efetivamente o crime de detenção de arma proibida: por morte do pai do arguido e da vítima não se procedeu à partilha dos bens existentes, sendo um desses bens uma casa de habitação, com anexos, num dos quais residia o recorrente. A espingarda caçadeira em causa pertencera ao pai do arguido, estava registada em nome da mãe e na altura encontrava-se nesse anexo. Não se sabe a que título ali se encontrava, quem a colocara ali e desde quando ali se encontrava. Sabe-se apenas que a foi buscar para disparar sobre o irmão. Não se pode assim ter como assente que a arma era detida pelo arguido. Este ato, único conhecido do recorrente em relação à arma, configura simples uso: o arguido limitou-se a utilizar a arma para realizar o homicídio. V. Essa conduta do recorrente, não possuindo ele a necessária licença de uso e porte, preenche o tipo objetivo do crime do artigo 86.º, n.º 1, alínea c) , da Lei 5/2006: a espingarda em causa é uma “arma de fogo longa” [ alíneas p) , q) e s) do n.º 1 do artigo 2.º]; é uma arma de “tiro a tiro” [alínea aj) ]; é uma arma de cano de “ alma lisa”, sendo pois, uma arma da classe D: “São armas da classe D: As armas de fogo longas de tiro a tiro de cano de alma lisa” [artigo 3.º, n.º 6, alínea c) ]. VI. E, não obstante o homicídio ser agravado em função da utilização da espingarda, ao abrigo do artigo 86.º, n.º 3, não é valorada nessa agravação a situação de proibição em que o recorrente se encontrava em relação à arma, por falta da licença de uso e porte. Isso porque à agravação é indiferente que o agente esteja numa

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