TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
259 acórdão n.º 293/12 de recurso que tenha por objeto a reapreciação da prova gravada radica na maior dificuldade que se depara ao recorrente, face ao disposto nos n. os 3 e 4, do artigo 412.º do Código de Processo Penal. 25 – São diversos os acórdãos deste Tribunal Constitucional julgando inconstitucional, por violação do artigo 32. º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, a norma constante do artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de o prazo para a interposição de recurso em que se impugne a decisão da matéria de facto e as provas produzidas em audiência tenham sido gravadas, se conta sempre a partir da data do depósito da sentença na secretaria, e não da data da disponibilização das cópias dos suportes magnéticos, tempes- tivamente requeridas pelo arguido recorrente, por as considerar essenciais para o exercício do direito de recurso. Neste sentido, recordamos os Acórdãos n. os 545/06, 546/06, 194/07 e 380/07. 26 – Resulta da norma do artigo 101.º n.º 3 do CPP, que a entrega da cópia da prova gravada depende do preenchimento de dois requisitos cumulativos, sim, mas não necessariamente simultâneos: por um lado, a apre- sentação do requerimento respetivo e por outro, o fornecimento dos suportes necessários. Em nenhum momento encontramos na lei referência à exigência de entrega, conjunta e simultânea destes dois elementos, como pretende o Acórdão recorrido. 27 – Sendo que a entrega dos suportes só se revelará necessária, diríamos mesmo, imprescindível, a partir do momento em que houver deferimento do requerimento respetivo, pois só a partir desta data será legítimo aos funcionários judiciais dar cumprimento ao despacho que deferir o mesmo. E mais ainda, numa situação (como a dos autos) em que o tribunal, perante o requerimento dos recorrentes, reconhece a inexistência de aparelho capaz de proceder à solicitada duplicação das gravações. 28 – Resulta assim, que o prazo de interposição de recurso (em que se impugne a matéria de facto) a que alude o artigo 411.º, n.º 1 e 4 do Código de Processo Penal terá, pelo menos, que se considerar suspenso entre o momento em que de acordo com o artigo 101.º, n.º 3 do CPP, são requeridas pelo arguido cópias das gravações da prova produzida em audiência e a sua efetiva disponibilização ao mesmo. 29 – Sendo que, no caso do requerimento de pedido de cópias das gravações tiver ido a despacho do juiz, designadamente pelo facto do Tribunal, na altura, não possuir meios técnicos para proceder à duplicação das gra- vações, o arguido recorrente, apenas está obrigado a entregar os necessários suportes após ter sido notificado do deferimento do seu requerimento. E neste caso, continuará a beneficiar da suspensão do prazo de interposição de recurso se atuar de forma diligente, ou seja, entregar no Tribunal os necessários suportes no dia seguinte à notifica- ção do deferimento do seu requerimento. 30 – Entendimento diferente, para além de violar os princípios da confiança, da boa fé e da cooperação que devem reger as relações dos sujeitos processuais com o tribunal, violaria gravemente o efetivo direito ao recurso em processo criminal, consagrado no artigo 32.º, n.º1, da Constituição. 31 – O direito de defesa do arguido em processo penal, constitucionalmente estatuído, é uma cláusula geral que inclui não só todas as garantias explicitadas nos diversos números do artigo 32.º da CRP, mas também todas as demais que decorram da necessidade de efetiva defesa do arguido. Este preceito deve ser interpretado à luz do denominado processo penal equitativo e leal, no qual o Estado, ao fazer valer o seu jus puniendi, deve atuar com respeito pela pessoa do arguido, considerando um sujeito processual a quem devem ser asseguradas todas as possibi- lidades de contrariar a acusação, de ser julgado por um tribunal independente e do processo decorrer com lealdade de procedimentos, considerando-se ilegítimas quaisquer disposições, ou suas interpretações, que impliquem uma diminuição inadmissível das possibilidades de defesa do arguido. 32 – Uma das manifestações deste direito à defesa, atualmente (desde a Revisão de 1997) com consagração específica no texto constitucional (artigo 32.º, n.º 1, in fine ) é o direito ao recurso. De modo a garantir a possibili- dade de defesa contra a prolação de decisões injustas, deve ser assegurada ao arguido a possibilidade de as impugnar para um segundo grau de jurisdição, delas recorrendo. Mas, para que esta possibilidade seja efetiva, é necessário que as normas processuais que regulamentam o direito ao recurso assegurem que o arguido recorrente tenha a possibilidade de analisar e avaliar criteriosamente os fundamentos da decisão recorrida, de forma a permitir-lhe um exercício consciente, fundado e eficaz desse seu direito.
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