TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012

174 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O tribunal a quo considerou que a norma em causa, interpretada no sentido de que significa a proibição da suspensão da instância nos casos previstos no artigo 279.º, n.º 1, do Código de Processo Civil padecia de inconstitucionalidade material, por violação do princípio constitucional da tutela jurisdicional efetiva e proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.º da Constituição. 5. Importa começar por recordar os contornos do presente caso. A requerente do processo de insolvência invocou ser titular de um crédito sobre os requeridos, no valor de 130 000 Euros, alegando, entre o mais, que em processo de falência anteriormente intentado contra os requeridos, tinha ocorrido uma transação, homologada por sentença transitada em julgado, que não fora cumprida. No entanto, a requerida mulher invocou que a referida transação era nula. Nesse seguimento, intentou ação declarativa de condenação, na qual pedia que fosse declarada a nulidade da transação homo- logada por sentença. Só posteriormente a requerente veio intentar ação de insolvência. O juiz do processo de insolvência considerou que na ação declarativa se iria discutir uma questão prejudicial da questão de insolvência. No entanto, nos termos da norma objeto do recurso – artigo 8.º, n.º 1, do CIRE –, não seria possível suspender a instância no processo de insolvência, já que essa não era uma das hipóteses expressamente previstas na regu- lação do processo de insolvência, pelo que estaria vedada a aplicação do artigo 279.º, n.º 1, do CPC. Con- siderou o juiz que, ao não ser possível a suspensão da instância até decisão da referida questão prejudicial, a requerida mulher não teria a possibilidade de provar os factos alegados relativos à validade da transação, pelo que o artigo 8.º, n.º 1, do CIRE, na interpretação de acordo com a qual tal norma significa sempre a proibi- ção da suspensão da instância fora os casos previstos no próprio diploma, padeceria de inconstitucionalidade material. Em causa estaria a violação do princípio constitucional da tutela jurisdicional efetiva e proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.º da Constituição. Na análise da presente questão importa sublinhar, desde logo, que não incumbe ao Tribunal Consti- tucional pronunciar-se sobre a qualificação da questão relativa à validade da transação homologada como “ questão prejudicial do processo de insolvência”. Incumbe apenas sindicar se a norma objeto do presente recurso – na medida em que não permite a suspensão da instância – viola a Constituição, nomeadamente o princípio da tutela jurisdicional efetiva, previsto no seu artigo 20.º O que importa saber é se, não per- mitindo a suspensão da instância no presente contexto, a norma em causa coarta de forma inadmissível os direitos de defesa das partes. 6. O n.º 1 do artigo 8.º é uma norma inovatória introduzida pelo CIRE, pois não constava qualquer determinação nesse sentido no diploma por ele revogado, o Código dos Processos Especiais de Recupera- ção da Empresa e de Falência (CPEREF), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de abril. O novo diploma pretendeu atribuir maior celeridade ao processo de insolvência, como se pode ler no preâmbulo ( n. os  12 e 15) do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, que aprovou o CIRE. O objetivo da celeridade adquire, no processo de insolvência, uma dimensão de primeiro plano (Menezes Cordeiro “Introdução ao Direito da Insolvência”, in O Direito , 137. º, 2005, III, p. 479), que se justifica por duas ordens de razões; em primeiro lugar, devido à situação de incerteza que caracteriza o estado do património envolvido durante o processo de insolvência; em segundo lugar, devido à natureza do próprio processo de insol- vência, que é uma execução universal que envolve inúmeros interesses contrapostos: o do insolvente, porventura interessado em retardar ou evitar a insolvência, os dos diferentes credores, marcados por objetivos concorrentes e muitas vezes antagónicos e, ainda, o interesse de terceiros, que aspiram à normal prossecução da sua atividade, sem serem afetados por operações falimentares que venham a ocorrer no futuro. Tendo presente as várias posições em conflito, a ordem jurídica optou claramente pela celeridade na obtenção da sentença final nesses processos, preocupação que se concretizou, por exemplo, na simplificação do respetivo procedimento; o CIRE qualifica o processo de insolvência como processo urgente, submetido a um regime processual expedito, gozando de precedência sobre o serviço ordinário do tribunal. A celeridade

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