TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012

165 acórdão n.º 247/12 14. O que importa questionar neste ponto é saber se, ao estipular um prazo de três anos para a instau- ração da ação de investigação da filiação, nos casos em que tenha ocorrido posse de estado, o legislador terá ultrapassado a margem de conformação que lhe cabe, fixando um prazo que se afigure desproporcionalmente exíguo e por isso violador do direito à identidade pessoal, previsto no artigo 26.º da Constituição. Da jurisprudência do Tribunal decorre que, para que os prazos de caducidade das ações de investigação da maternidade e da paternidade respeitem o princípio da proporcionalidade, eles têm de deixar aos titulares do direito à identidade pessoal uma real e efetiva possibilidade de exercerem o direito de investigação. Pode considerar-se, aliás, ser esse o conteúdo essencial do direito em causa, e não um suposto direito a investigar ad aeternum as referidas relações de filiação. Esta orientação ressalta, aliás, de alguns arestos do Tribunal Constitucional, como se denota da seguinte passagem, retirada do Acórdão n.º 626/09: « Contudo, para além do modo como se processa a contagem desse prazo, importa também saber se este per- mite, em concreto, o exercício do direito em tempo útil, ou se, pelo contrário, é de tal modo exíguo que inviabiliza ou dificulta gravemente esse exercício, tornando-se numa verdadeira restrição ao conteúdo daquele direito funda- mental.» É também essa a exigência mínima que decorre da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), que aceita a sujeição das ações de estabelecimento da filiação ao cumprimento de deter- minados pressupostos, entre eles a exigência de prazos, desde que não se tornem impeditivos do uso do meio de investigação em causa, ou representem um ónus exagerado (assim, se referiu no caso Mizzi c. Malta ). A existência de um prazo limite para a instauração duma ação de reconhecimento judicial da paternidade não é, só por si, violadora da Convenção, importando verificar se a natureza, duração e características desse prazo resultam num justo equilíbrio entre o interesse do investigante em ver esclarecido um aspeto importante da sua identidade pessoal, o interesse do investigado e da sua família mais próxima em serem protegidos de demandas respeitantes a factos da sua vida íntima ocorridos há já muito tempo, e o interesse público da estabilidade das relações jurídicas, sustenta a jurisprudência do TEDH. 15. Para averiguar se o novo regime de prazos de caducidade das ações de investigação da filiação respeita o princípio da proporcionalidade e o conteúdo essencial atrás delineado, há que ter em conta dois aspetos: em primeiro lugar, a fixação do início desses prazos e, em segundo lugar, os limites temporais adoptados, a sua duração. No que toca ao primeiro aspeto, há que ter presente que o prazo em análise começa a contar a partir de factos subjetivos. A norma é clara quando refere que o mesmo só deve começar a contar “quando o inves- tigante tenha tido conhecimento de factos ou circunstâncias que justifiquem a investigação”. Em sentido semelhante, o Tribunal não julgou inconstitucional a norma prevista no artigo 1842.º, n.º 1, alínea a) , do Código Civil, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 496/77, de 25 de novembro, na medida em que prevê, para a caducidade do direito do marido da mãe impugnar a sua própria paternidade presumida, o prazo de dois anos a contar da data em que teve conhecimento de circunstâncias donde se possa concluir a sua não paternidade (Acórdão n.º 589/07, publicado em Acordãos do Tribunal Constitucional , 70. º Vol., p. 519). O referido prazo de dois anos, porque contado a partir de um facto subjetivo, foi então considerado como razoável e adequado, na medida em que permite ao impugnante avaliar todos os fatores que podem condi- cionar a decisão. Em sentido semelhante se orientou também o Acórdão n.º 626/09: « Todavia, o prazo especial previsto no n.º 3 do artigo 1817.º do Código Civil, na redação do Decreto-Lei n.º 496/77, de 25 de novembro, apresenta uma diferença assinalável relativamente ao prazo-regra outrora consa- grado no n.º 1 do mesmo artigo, quando aplicável às ações de investigação da paternidade.

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