TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012

164 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Desde logo, há que ter presente que ainda existem situações, porventura residuais, em que, face à inexistência de um registo universal de ADN, quando não é conhecido o paradeiro do investigado ou este já faleceu (como sucede no presente caso) e o seu cadáver não está acessível ( v. g. porque foi cremado), não existindo familiares dire- tos do suposto pai necessários à realização dos exames periciais, não é possível a determinação científica da filiação, havendo que recorrer aos meios tradicionais de prova, pelo que nessas situações continua a fazer todo o sentido a intenção de evitar a valorização de provas pouco fiáveis devido ao seu envelhecimento, sendo o estabelecimento de prazos de caducidade um meio ao dispor do legislador para atingir esse objetivo. “ Mas, já num plano geral, não é possível ignorar que a constituição e a determinação integral do vínculo de filiação, abrangendo ambos os progenitores, corresponde a um interesse de ordem pública, a um relevante princí- pio de organização jurídico-social. O dar eficácia jurídica ao vínculo genético da filiação, propiciando a localização perfeita do sujeito na zona mais nuclear do sistema das relações de parentesco, não se repercute apenas na relação pai-filho, tendo projeções externas a essa relação ( v. g. em tema de impedimentos matrimoniais). É do interesse da ordem jurídica que o estado pessoal de alguém não esteja amputado desse dado essencial. Daí, além do mais, a consagração da averiguação oficiosa de paternidade (artigos 1864.º e seguintes). E importa que esse objetivo seja alcançado o mais rápido possível, numa fase ainda precoce da vida do filho, evitando-se um prolongamento injus- tificado de uma situação de indefinição na constituição jurídica da relação de filiação. É do interesse público que se estabeleça o mais breve que seja possível a correspondência entre a paternidade biológica e a paternidade jurídica, fazendo funcionar o estatuto jurídico da filiação com todos os seus efeitos, duma forma estável e que acompanhe durante o maior tempo possível a vida dos seus sujeitos. Esses prazos funcionam como um meio de induzir o titular do direito inerte ou relutante a exercê-lo com brevidade, não permitindo um prolongamento injustificado duma situação de indefinição, tendo deste modo uma função compulsória, pelo que são adequados à proteção dos apontados interesses, os quais também se fazem sentir nas relações de conteúdo pessoal, as quais, aliás, têm muitas vezes, como sucede na relação de filiação, importantes efeitos patrimoniais”. (…) Ora, o meio, por excelência, para tutelar estes interesses atendíveis públicos e privados ligados à segurança jurídica, é precisamente a consagração de prazos de caducidade para o exercício do direito em causa. Esses prazos funcionam como um meio de induzir o titular do direito inerte ou relutante a exercê-lo com brevidade, não per- mitindo um prolongamento injustificado duma situação de indefinição, tendo deste modo uma função compul- sória, pelo que são adequados à proteção dos apontados interesses, os quais também se fazem sentir nas relações de conteúdo pessoal, as quais, aliás, têm muitas vezes, como sucede na relação de filiação, importantes efeitos patrimoniais. Apesar da inexistência de qualquer prazo de caducidade para as ações de investigação da paternidade, permi- tindo que alguém exerça numa fase tardia da sua vida um direito que anteriormente negligenciou, poder corres- ponder a um nível de proteção máximo do direito à identidade pessoal, isso não significa que essa tutela otimizada corresponda ao constitucionalmente exigido.» 13. Na situação em causa, as preocupações mencionadas no Acórdão n.º 401/11 como sendo valores merecedores de tutela mantêm a sua validade. Com efeito, como o Tribunal Constitucional reconheceu no citado aresto, interesses gerais ou valores de organização social em torno da instituição familiar podem justificar a consolidação definitiva na ordem jurídica de uma paternidade, porventura não correspondente à realidade biológica, a partir do decurso de um determinado lapso de tempo. Nessa situação estarão os interesses da segurança e da certeza jurídicas res- peitantes ao comércio jurídico em geral, que exigem a estabilização das relações de filiação já estabelecidas. Os referidos valores exigem que as relações de parentesco sejam dotadas de estabilidade, impondo-se aos interessados o ónus de agirem rapidamente, de forma a clarificarem as relações de parentesco existentes. Tais considerações mantêm toda a validade nos casos em que ocorreu posse de estado. É, assim, uma opção válida do legislador pretender proteger os valores da certeza e da segurança jurídica.

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