TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
162 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL aplicando-se às ações de investigação de paternidade, por força do artigo 1873.º do mesmo Código, prevê um prazo de dez anos para a propositura da ação, contado da maioridade ou emancipação do investigante. O Tribunal Constitucional considerou que o referido prazo de dez anos, compreendido numa ponderação inte- grada do conjunto de prazos de caducidade estabelecidos nos diversos números do artigo 1817.º do Código Civil, se revelava “suficiente para assegurar que não opera qualquer prazo de caducidade para a instauração pelo filho duma ação de investigação da paternidade, durante a fase da vida deste em que ele poderá ainda não ter a maturidade, a experiência de vida e a autonomia suficientes para sobre esse assunto tomar uma decisão suficientemente consolidada”. 9. Tendo a decisão recorrida aderido à jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça que sustenta a imprescritibilidade das ações de investigação de paternidade (por todos, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 23/2006), e considerando ainda a jurisprudência do Tribunal Constitucional que afastou aquela imprescritibilidade (Acórdão n.º 401/11), vejamos se o atual prazo para propositura daquela ação, quando assente em posse de estado – três anos contados a partir da cessação desta –, é conforme à Constituição. 10. No decurso da evolução jurisprudencial já exposta, o Tribunal tem, no entanto, mantido a linha central de fundamentação das suas decisões. Essa linha assenta na consideração de que a fixação de prazos de caducidade para as ações de investigação da filiação não é, em si, inconstitucional. A jurisprudência do Tribunal tem divergido, não no que toca à conformidade constitucional da fixação de prazos para as ações de investigação da filiação, mas em relação à proporcionalidade dos prazos concretamente fixados. O juízo de inconstitucionalidade depende, na verdade, da ponderação de direitos ou interesses contra- postos. A admissibilidade da sujeição das ações de investigação da filiação a prazos prende-se com o reconhe- cimento de que os valores que as referidas ações visam salvaguardar não são valores absolutos; o Tribunal tem aceitado que o legislador opte por salvaguardar outros valores, merecedores de proteção, que, em concreto, se podem revelar conflituantes com o direito à identidade pessoal. Assim o diz o Acórdão n.º 446/10: « Deve salientar-se, todavia, que este movimento de reforço da tutela do interesse do filho em conhecer as suas origens genéticas e sociais, se consolidou o princípio de verdade biológica como “estruturante de todo o regime legal”, de forma alguma lhe atribuiu autónoma dignidade constitucional (cfr. Pereira Coelho/Guilherme de Oli- veira, Curso de direito de família, II, tomo I, Coimbra, p. 52). A verdade biológica “não pode fundamentar, por si só, um juízo de inconstitucionalidade”, como salientou, relativamente à norma que fixa um prazo de propositura da ação de impugnação da paternidade, o Acórdão n.º 589/07. Muito menos foi alguma vez aceite que esse prin- cípio seja dotado de valor absoluto, que o leve a sobrepor-se a todos os demais. A verdade biológica impõe-se na medida em que tal seja exigido por outros princípios e não contrariado por princípios contrapostos eventualmente prevalecentes.» Deverá, por isso, continuar a entender-se que o legislador ordinário goza de liberdade para determinar, desde que acautelado o conteúdo essencial dos direitos fundamentais em causa, se pretende submeter as ações de investigação da paternidade a um prazo preclusivo ou não, cabendo-lhe ainda fixar, dentro dos limi- tes constitucionais admitidos pelo respeito pelo princípio da proporcionalidade, o concreto limite temporal de duração desse prazo. É a esta luz que importa analisar se a norma objeto do presente recurso, na medida em que estabelece um prazo de três anos para a propositura da ação de investigação da paternidade / maternidade após a cessa- ção do tratamento como filho pelo pretenso progenitor, respeita a Constituição. 11. Em primeiro lugar, importa afirmar que são diversas as razões que subjazem aos regimes previstos nos n. os 1 e 3, alínea b) , do artigo 1817.º do Código Civil. Assim, enquanto o n.º 1 prevê o prazo geral durante o qual o investigante pode propor a ação de investigação de paternidade (10 anos após a maioridade), já o
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