TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
159 acórdão n.º 247/12 5. Nos Acórdãos n. os 99/88 e 370/91 o Tribunal pronunciou-se pela não inconstitucionalidade dos prazos previstos nos n. os 3 e 4 do artigo 1817.º do Código Civil. Afirmou-se no primeiro dos citados arestos: « O problema está em saber se, aceite o postulado de que a Constituição consagra um direito fundamental ao conhecimento e reconhecimento da paternidade, ele há de necessariamente traduzir-se, ao nível do sistema legal, no imperativo “absoluto” referido pelo autor, entendido o qualificativo nos estritos termos pressupostos na trans- crição feita – ou seja, como excluindo toda e qualquer regulamentação que, não apenas restrinja, mas simplesmente condicione o exercício do direito em causa, e possa vir a traduzir-se, assim, num obstáculo concreto à sua completa fruição. Ora, tal como ocorre com outros direitos fundamentais, não há por que ser tão radical, e não há por que sê-lo, muito menos, num domínio (como é o do estabelecimento da paternidade de filhos nascidos fora do casamento) onde uma “regulamentação“ legislativa, dispondo sobre as condições e os modos do estabelecimento dessa paterni- dade, é afinal imprescindível para “introduzir e acomodar na vida jurídica” (como diz Vieira de Andrade, ob. cit. , p. 217) o direito em questão, ou seja, é condição necessária da sua mesma e real efetividade. Assente isto, uma distinção básica deverá logo ter-se aqui em conta, dentro das intervenções legislativas ou das normas legais respeitantes a direitos fundamentais (cfr. por todos, autor e lugar citados): a que decorre justamente entre as normas restritivas desses direitos (normas que encurtam ou estreitam o seu conteúdo e alcance) e as mera- mente condicionadoras do respetivo exercício (normas que não visam aquele objetivo da redução das faculdades ou potencialidades integradoras do direito em causa e se limitam a definir pressupostos ou condições do seu exercício). Com efeito, enquanto as primeiras, para se legitimarem constitucionalmente, haverão de responder ao conjunto de exigências e cautelas a esse respeito consignadas no artigo 18.º, n. os 2 e 3, da Lei Fundamental, já tais exigências e cautelas não se põem, por definição, quanto às segundas, as quais, assim, desde logo e designadamente, não neces- sitam de uma credencial ou previsão constitucional ou previsão constitucional expressa, autorizando ao legislador a sua emissão. Pois bem: nas normas ora em apreço – e ao contrário do que a recorrente alega – devem ver-se, não propriamente “restrições” ao direito fundamental em causa, mas antes, simplesmente, “condicionamentos” a que tem de obedecer o respetivo exercício. E justamente logo por aí haverá de excluir-se que as mesmas normas violem esse direito. [...] 12 – Dir-se-á, porém, que, como é oportunamente advertido por Vieira de Andrade ( op. cit. , p. 228, n.º 27), “ a distinção entre condicionamento e restrição é fundamentalmente prática, já que não é possível definir, com exatidão, em abstrato os contornos das duas figuras”, pelo que “muitas vezes é apenas um problema de grau ou de quantidade”. E que, sendo assim, não bastará considerar as coisas na perspetiva “estrutural”, antes adotada, para se concluir pela não inconstitucionalidade das normas em apreço, e sempre será preciso aferir da justeza dessa conclusão à luz de um ponto de vista “material” ou “substantivo”. Ponto de vista que, ao fim e ao cabo, há de reconduzir-se ainda (tal qual sucede com as «restrições» de direitos) a um critério de adequação e proporcionali- dade. Simplesmente, mesmo de um tal ponto de vista, não há fundamento para se chegar a um resultado diverso do apurado. Tudo está em que, face ao direito do filho ao reconhecimento da paternidade, se perfilam outros direitos ou interesses, igualmente merecedores de tutela jurídica: em primeiro lugar, e antes de mais, o interesse do pretenso progenitor em não ver indefinida ou excessivamente protelada uma situação de incerteza quanto à sua paternidade, e em não ter de contestar a respetiva ação quando a prova se haja tornado mais aleatória; depois, um interesse da mesma ordem por parte dos herdeiros do investigado, e com redobrada justificação no tocante à álea da prova e às eventuais dificuldades de contraprova com que podem vir a confrontar-se; além disso, porventura, o próprio interesse, sendo o caso, da paz e da harmonia da família conjugal constituída pelo pretenso pai. É o equi- líbrio entre o direito do filho e este conjunto de interesses que normas como as dos n. os 3 e 4 do artigo 1817.º do Código Civil visam assegurar, sem que se possa dizer que o façam de modo desproporcionado (isto é, com excessivo sacrifício daquele direito), quer considerado o estabelecimento, em si, de prazos de caducidade, quer considerada a duração de tais prazos. E como todos os interesses em presença não deixam igualmente de encontrar ressonância constitucional – seja ainda nos artigos 25.º, n.º 1 (integridade moral), e 26.º, n.º 1 (direito à reputação e à reserva
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