TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
142 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Isto significa que temos de verificar se os quantitativos cujo pagamento é suspenso pelo disposto nos artigos 21.º e 25.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro (Orçamento do Estado para 2012), num “cri- tério de evidência” no controlo da igualdade proporcional, não são excessivamente diferenciadores, face às razões que se admitiram como justificativas de uma redução de rendimentos apenas dirigida aos cidadãos que os auferem por verbas públicas. Para este juízo é necessário relembrar e pesar os sacrifícios impostos pelas normas sob fiscalização a quem aufere remunerações ou pensões por verbas públicas. Do seu conteúdo resulta que os pensionistas e os trabalhadores do setor público com rendimentos ilíqui- dos situados entre € 600 a € 1100 terão uma redução do seu rendimento anual que aumentará progressiva- mente até 14,3%. Estamos num universo em que a exiguidade dos rendimentos já impõe tais provações que a exigência de um sacrifício adicional deste tipo, como seja a sua redução, numa percentagem que vai pro- gressivamente aumentando, até atingir 14,3% do rendimento anual, tem um peso excessivamente gravoso. Os demais pensionistas e os que auferem remunerações ilíquidas entre € 1100 e € 1500 terão uma diminuição do seu rendimento anual em 14,3%, a qual, neste universo, assume uma dimensão considerável quando se compara a sua situação com a daqueles que, com o mesmo nível de rendimentos, ou até superior, não são afectados com qualquer redução dos mesmos. Não se esqueça, no que toca às pensões mais elevadas, que naquelas que excedem 12 vezes o valor do indexante dos apoios sociais, o montante excedente é reduzido em 25%, e quando ultrapassam em 18 vezes aquele valor a redução é de 50%. E para os que auferem remunerações ilíquidas superiores a € 1500, a redução é também de 14,3% do seu rendimento anual. Ora, se o Tribunal Constitucional, no referido Acórdão n.º 396/11, neste mesmo uni- verso, perante a redução salarial ocorrida no ano de 2011, determinada pelo artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que se situou entre 3,5% e 10% do rendimento anual, entendeu que a transitoriedade e os montantes das reduções efetuadas nos rendimentos dos funcionários públicos se continham ainda dentro dos limites do sacrifício adicional exigível, o acréscimo de nova redução, agora de 14,3% do rendimento anual, mais do que triplicando, em média, o valor das reduções iniciais, atinge um valor percentual de tal modo elevado que o juízo sobre a ultrapassagem daquele limite se revela agora evidente. Estas medidas terão uma duração de três anos (2012 a 2014), o que determinará a produção de efeitos cumulativos e continuados dos sacrifícios ao longo deste período, a que acresce o congelamento dos salários e pensões do setor público, verificado nos anos de 2010, 2011 e 2012, e cuja manutenção nos anos seguintes se encontra prevista nos memorandos que consubstanciam o PAEF, o que, conjugado com o fenómeno da inflação, resulta numa redução real desses salários e pensões equivalente às taxas de inflação verificadas em todos esses anos. Ora, nenhuma das imposições de sacrifícios descritas tem equivalente para a generalidade dos outros cidadãos que auferem rendimentos provenientes de outras fontes, independentemente dos seus montantes. A diferença de tratamento é de tal modo acentuada e significativa que as razões de eficácia da medida adotada na prossecução do objetivo da redução do défice público para os valores apontados nos memorandos de entendimento não tem uma valia suficiente para justificar a dimensão de tal diferença, tanto mais que poderia configurar-se o recurso a soluções alternativas para a diminuição do défice, quer pelo lado da despesa ( v. g. , as medidas que constam dos referidos memorandos de entendimento), quer pelo lado da receita ( v. g. através de medidas de carácter mais abrangente e efeito equivalente à redução de rendimentos). As referidas soluções, podendo revelar-se suficientemente eficientes do ponto de vista da realização do interesse público, permitiriam um desagravamento da situação daqueles outros contribuintes que auferem remunerações ou prestações sociais pagas por verbas públicas. Daí que seja evidente que o diferente tratamento imposto a quem aufere remunerações e pensões por verbas públicas ultrapassa os limites da proibição do excesso em termos de igualdade proporcional. Apesar de se reconhecer que estamos numa gravíssima situação económico-financeira, em que o cum- primento das metas do défice público estabelecidas nos referidos memorandos de entendimento é impor- tante para garantir a manutenção do financiamento do Estado, tais objetivos devem ser alcançados através
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