TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 84.º Volume \ 2012
115 acórdão n.º 229/12 Deve, além disso, notar-se que, na sua aplicação, as sanções de repreensão se dirigem a uma infração específica, estritamente relacionada com a prestação do serviço militar, e, ainda assim, a repreensão segue uma regra de comunicação restrita ou de difusão limitada. Ela é aplicada em privado (artigo 31.º) ou, nos casos mais graves, perante outros militares, mas ainda assim apenas na presença de militares de posto superior ou equivalente e dentro da unidade, estabelecimento ou órgão a que pertencem (artigo 32.º do RDM), não podendo o facto da punição ser publicado (artigos 61.º e 107.º, n.º 3, do RDM). Acresce que as sanções de repreensão, tal como quaisquer outras, apenas podem ser aplicadas na sequência de um processo em que o arguido teve oportunidade de se pronunciar em sua defesa com todas as necessárias garantias (artigos 99.º a 103.º do RDM). Logo, não é possível dizer-se, como pretende o Requerente, que há uma violação do princípio da presunção de inocência (artigo 32.º, n.º 2, da Constituição) ou das garantias de defesa em processo disciplinar (artigo 32.º, n. os 1 e 10, da Constituição). O juízo sobre a prática de uma infração surge após o decurso de um processo que dá as devidas garantias de defesa, e essas garantias são proporcionais à natureza da infração e à gravidade da sanção que possam estar em causa. No caso, o processo disciplinar, tal como está regulado, tendo em conta a menor gravidade das sanções e apesar da ausência de recurso hierárquico prévio à execução, constitui garantia suficiente do princípio da presunção de inocência. Acrescente-se, também, que não é possível uma leitura a contrario do artigo 133.º do RDM no sentido de que as sanções de repreensão não seriam passíveis de impugnação em juízo. A sanção disciplinar de repreensão, ou de repreensão agravada, mesmo depois de executada, tal como outras sanções disciplinares militares, é suscetível de impugnação (artigo 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da Cons- tituição) que, em caso de procedência, gera a reconstituição da situação jurídica violada e a consequente eliminação da sanção do respetivo registo disciplinar, embora a providência de suspensão da eficácia que pudesse ser associada a essa impugnação tenha uma eficácia limitada por se tratar de ato já executado (artigo 129. º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos). Como esclarece Mário Aroso de Almeida ( Constituição da República Portuguesa Anotada , org. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Tomo III, p. 613), “o que o artigo 268.º, n.º 4, hoje, diz, é que a garantia de impugnação de atos administrativos se estende a todos os atos que impliquem, de alguma forma, a lesão de direitos ou interesses, porque deve ser este o conteúdo material da impugnabilidade dos atos administrativos. Esta garantia vale em relação a todo e qualquer ato administrativo, independentemente da entidade que o pratique ou do contexto procedimental em que seja produzido: basta que um ato administrativo seja passível de lesar direitos ou interesses protegidos”. É esta a jurisprudência firmada por este Tribunal, nomeadamente, no Acórdão n.º 416/99. E nem se diga que da previsão constitucional expressa de “recurso para o tribunal competente”, relativa ao caso da sanção de prisão disciplinar militar, prevista no artigo 27.º, n.º 3, alínea d) , da Constituição (ante- riormente, alínea c) , se retira que as sanções disciplinares militares restantes não são passíveis de impugnação jurisdicional. Sobre a questão pronunciou-se o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 90/88, que acerca dessa norma constitucional refere: « De qualquer forma, o alcance do disposto na alínea c) [ hoje alínea d) do n.° 3 do artigo 27.° da Lei Fundamental só pode ser o de reforçar a garantia constitucional do recurso contencioso, e nunca o de, a contrario sensu , vir eliminar essa garantia no que respeita às decisões disciplinares, no âmbito militar, que não apliquem penas privativas da liberdade». Tal como, aliás, lhes é, igualmente, garantido o recurso hierárquico, muito embora, diferentemente das outras sanções disciplinares militares, a interposição deste recurso não suspenda a decisão recorrida (artigo 123. º, n.º 2, do RDM). Em suma, no que respeita à sanção de repreensão, o RDM estabelece um equilíbrio entre o interesse da disciplina e da hierarquia militar e os direitos dos militares individualmente considerados. O superior interesse da disciplina e da hierarquia militar está garantido através de brevidade do espaço de tempo entre a prática da infração e a aplicação da pena. A proteção do militar, por sua vez, está devidamente acautelada
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