TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
94 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 281.º, n.º 2, alínea g) , da Constituição, que estipula que o pedido de declaração de inconstitucionalidade, quando por eles acionado, se deverá fundar em violação dos direitos das regiões autónomas, e não em viola- ção do respetivo estatuto. Nem tem cabimento afirmar que, deste modo, se retira aos deputados regionais o poder de desencade- arem a intervenção do Tribunal Constitucional para garantir a observância da repartição de competências entre órgãos regionais. O critério de legitimidade, tal como se encontra definido no artigo 281.º da Consti- tuição, é uma opção constitucional que tem por base, não um mero interesse pessoal ou político-partidário, mas a titularidade de determinados cargos e a sua especial vocação para a defesa e garantia do princípio da constitucionalidade e da legalidade; e, no caso, entendeu-se que os deputados regionais são especialmente qualificados para defender a autonomia regional, seja com fundamento na violação dos direitos das regiões autónomas, seja com fundamento na violação do estatuto regional, deixando de lado o poder de iniciativa no tocante a outras matérias em que esteja em causa a mera relação interna entre órgãos regionais. E é este critério que o Tribunal Constitucional não pode deixar de acolher (cfr. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, II Vol., 4.ª edição, p. 967; neste sentido, o citado Acórdão n.º 198/00). Teria, por isso, decidido no sentido da ilegitimidade dos requerentes, tomando como assente que o vício imputado ao diploma legislativo em causa configura, em primeira linha, uma questão de inconstitucionali- dade, sobre a qual o Tribunal Constitucional não poderia deixar de se pronunciar, ainda que o pedido tenha sido originariamente reportado a matéria de ilegalidade. – Carlos Alberto Fernandes Cadilha. DECLARAÇÃO DE VOTO Votei vencido quanto à pronúncia de ilegalidade do artigo 27.º do Decreto Legislativo Regional n.º 6/2011, de 10 de março, pelas seguintes razões: O vício que os requerentes apontam à norma consiste, essencialmente, na violação “da reserva de lei” que é, no seu entender, estabelecida na alínea e) do n.º 2 do artigo 59.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores. Acontece que não é ao Estatuto da Região que cabe distribuir as competências de produção normativa pelos órgãos regionais, pois tal tarefa cabe, exclusivamente, à Constituição. Conforme explica Jorge Miranda, existe uma autêntica “reserva de Constituição no domínio das competências legislativas, das formas e da força de lei” ( Manual de Direito Constitucional, Tomo V, 3.ª Edição, Coimbra Editora, 2004, p. 197), pelo que se é certo que “a Constituição permite ao legislador escolher o tempo e as circunstâncias da sua interven- ção e determinar ou densificar o seu conteúdo, desde que respeitados os fins, os valores e os critérios consti- tucionais (…) já no plano orgânico-formal é completa a vinculação, sob um tríplice aspeto: o dos órgãos, o das formas, e o da força jurídica”. E a verdade é que o invocado artigo 59.º, n.º 2, alínea e), do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores não visa identificar o órgão competente para a produção legislativa regional, pois tal já está determinado pela alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º e pelo n.º 1 do artigo 232.º da Constituição; a economia do preceito reside, com efeito, em fazer incluir na competência da Região o poder de legislar sobre matéria de política de saúde e, designadamente, sobre o “regime de licenciamento e funcionamento das farmácias”, conforme, aliás, permite a citada alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição, na sua atual redação. Isto significa que é a Constituição que assume o papel de norma primária sobre a produção jurídica, o que lhe reserva a definição de três importantes funções: a identificação das fontes de direito do ordenamento jurídico português, o estabelecimento de critérios de validade e eficácia de cada uma das fontes, e a determi- nação de competência das entidades que revelam normas de direito positivo. Na verdade, a identificação das
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=