TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
89 acórdão n.º 187/12 e 228.º da CRP, as matérias sobre as quais detém a região competência legislativa própria, para além de completar o edifício constitucional de repartição de competências entre República e região, é também, nos termos da CRP, norma apta a constituir por si mesma uma reserva a favor do legislador regional, de forma a excluir a possibilidade de, no território da região, vir a incidir sobre a “matéria” regulação proveniente da administração regional. Assim sendo, pela análise desta questão se começará. 8. É sabido que a sexta revisão da Constituição da República, levada a cabo pela Lei Constitucional n.º 1/2004, veio alterar profundamente o modelo básico de repartição de competências legislativas entre Estado e regiões. No centro da alteração encontra-se a nova função que às normas estatutárias é agora atri- buída. De acordo com a atual redação da alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º, e dos n.º 1 e 2 do artigo 228.º da CRP, cabe aos estatutos político-administrativos enunciar as matérias, ou os setores de atividade, em relação às quais se exerce a autonomia legislativa regional, em harmonia com o princípio da supletividade da legislação nacional. Daqui resulta, portanto, um quadro constitucional de repartição de competências entre República e regiões que, sendo diverso do vigente antes da sexta revisão da CRP – e tendo sido adotado pelo legislador de revisão com o intuito de assegurar uma mais ampla leitura do princípio da autonomia regional -, devolve aos estatutos político-administrativos a função de completar ou integrar o próprio modelo cons- titucional de repartição de competências entre legislador nacional e legislador regional. Na verdade, e como tem dito o Tribunal (vejam-se, entre outros, os Acórdãos n. os 258/07, 402/08, 432/08 e 304/11), o âmbito de atuação daquele último legislador passou a ser definido pela Constituição e pelos Estatutos Político-Admi- nistrativos das regiões, que, uma vez respeitadas as exigências impostas pelo âmbito regional e pela reserva de competência dos órgãos de soberania [artigos 112.º, n.º 4; 227.º, n.º 1, alínea a), da CRP], definem os setores de atividade sobre os quais se exercerá a competência legislativa regional. A questão que se coloca é, porém, a de saber se às normas estatuárias que enunciam as matérias sobre as quais a região exerce a sua autonomia legislativa pode, constitucionalmente, ser assinalada uma outra fun- ção para além daquela que acabou de descrever-se – a de completar ou integrar o quadro constitucional de repartição de competências entre legislador nacional e legislador regional. Mais precisamente, tudo está em saber se essas normas têm ainda, na ordem interna da região, o efeito de reservar à função legislativa regional a normação sobre as matérias enunciadas, com a consequente subtração da regulação administrativa. No caso, sustenta a requerente que assim é quanto ao artigo 59.º do EPARAA, que determina que “[c]ompete à Assembleia Legislativa legislar em matéria de política de saúde”, incluindo-se nela “o regime de licencia- mento das farmácias”. Deve desde já dizer-se que a Constituição não impede que se confira às normas estatutárias que enun- ciam as matérias que [tendo âmbito regional e não estando reservadas à competência dos órgãos de sobe- rania] são da competência legislativa própria da região, para além da função externa de recorte do âmbito das competências legislativas nacionais e regionais, ainda a função interna de distribuição de tarefas entre o que deve ser, na região, regulado por lei, e o que nela pode vir a ser objeto de regulação administrativa. Na verdade, dois argumentos de ordem constitucional sustentam esta conclusão. Encontra-se o primeiro na forma como a Constituição concebe os Estatutos Político-Administrativos. O lugar hierárquico que lhes reserva no quadro das fontes de Direito interno [onde, como já se viu, são “leis de valor reforçado”, nos termos dos artigos 112.º, n.º 3; 280.º, n.º 2, alíneas b) e c) , e 281.º, n.º 1, alíneas c) e d) ], associado ao procedimento especial que impõe para a sua aprovação (artigos 226.º) revelam a importância que os estatutos regionais têm no sistema da CRP. O Estatuto Político-Administrativo é a lei básica da região, que, dentro do quadro constitucional, regula o modo de organização e de exercício do poder autonómico, definindo as competências e inter-relações entre os órgãos de governo próprio da região e o estatuto dos seus titulares (artigo 231.º). As normas que integram esta lei básica, e que completam o quadro constitucional de repartição de competências entre legislador nacional e legislador regional, detêm,
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