TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

85 acórdão n.º 187/12 O fim daquela norma constante da alínea e) do n.º 2 do artigo 59.° do EPARAA é o de: i) estabelecer uma reserva de Decreto Legislativo para todo o “regime de funcionamento das farmácias”; ii) subtrair à ati- vidade administrativa as matérias compreendidas no âmbito daquele regime. As matérias relativas às “condições gerais e específicas de instalação, abertura e transferência de farmá- cias” estão indiscutivelmente compreendidas no regime jurídico das farmácias. Tais matérias não podem ser objeto de “definição” por Decreto Regulamentar Regional, como dispõe a norma questionada. A referida norma ofende portanto a reserva de lei estabelecida pelo 59.º do EPARAA, a qual é uma reserva legal total quanto às matérias cobertas pelo regime jurídico de licenciamento e funcionamento das farmácias. Além do mais, a norma daquele artigo 27.º contém uma impossível autorização legislativa concedida ao Governo Regional, conforme decorre do disposto no n.º 1 do artigo 232.º da Constituição. Nestes termos, o Requerente pede que o Tribunal declare a ilegalidade, com força obrigatória geral, da norma contida no artigo 27.° do Decreto Legislativo Regional n.º 6/2011, de 10 de março, por violação da reserva de lei estabelecida na alínea e) do n.º 2 do artigo 59.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores. 3. O Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, notificado, nos termos do artigo 54.º da LTC, para se pronunciar, querendo, sobre o pedido, veio responder essencialmente nos termos seguintes: As assembleias legislativas das regiões autónomas dispõem de competência legislativa genérica, no âmbito regional, em matérias enunciadas nos respetivos estatutos político-administrativos que não estejam reservadas aos órgãos de soberania. As disposições dos artigos 112.°, n.º 4, 227.°, n.º 1, e 232.°, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP) configuram uma efetiva reserva de lei formal a favor das assembleias legislativas das regi- ões autónomas, nos precisos termos aí enunciados, mas não autorizam o entendimento de que estejamos perante uma reserva de lei material, impondo às assembleias legislativas das regiões autónomas a completa conformação de todas as matérias de competência legislativa enunciadas nos respetivos estatutos político- -administrativos. Sempre e em qualquer matéria de competência legislativa das assembleias legislativas das regiões autó- nomas, cabe à lei material (decreto legislativo regional) a regulação das opções políticas primárias, ficando fora desta tudo o que respeite ao desenvolvimento de princípios gerais ou à fixação de condições específicas. No caso em apreço, importa saber se o decreto regulamentar regional é, do ponto de vista da confor- midade com a CRP e com o EPARAA, a forma adequada e suficiente para o estabelecimento normativo de desenvolvimento dos princípios gerais e de determinação das condições específicas de instalação, abertura e transferência de farmácias na Região Autónoma dos Açores, ou se se preferir, importa saber se o Governo Regional o pode fazer no exercício da sua função administrativa. É conhecida e apontada por diversos autores a problemática do crescente protagonismo metodológico da Administração na concretização do direito aplicável, a chamada “transfiguração material da própria lega- lidade” e o fenómeno das “normas legais em branco”, enquanto expressão de uma remissão material para valorações que conferem ao aplicador uma especial “elasticidade” adaptativa da norma legal ao caso concreto. O requerente, no pedido dirigido ao Tribunal Constitucional, parte do errado pressuposto de que com- pete ao legislador (através de decreto legislativo regional) o desenvolvimento dos princípios gerais e a deter- minação das condições específicas de instalação, abertura e transferência de farmácias, ou seja, de que a conformação de toda a arquitetura normativa até ao mais ínfimo pormenor do regime jurídico das farmácias na Região Autónoma dos Açores constitui reserva de lei material. Ora uma tal interpretação arcaica da reserva de lei material, baseada num modelo de legalidade dotado de uma disciplina exaustiva e imperativa de soluções, mostra-se totalmente incompatível com a salvaguarda

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