TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
505 acórdão n.º 96/12 própriasde administração do baldio para uma (ou mais) junta(s) de freguesia. No presente caso, consta da Ata da Assembleia de Compartes realizada em 14 de maio de 2000 que, colocada à votação proposta de delegação na junta de freguesia de Pindelo dos Milagres da gestão do baldio (e dos respetivos rendimentos), a mesma foi aprovada “por maioria qualificada com nenhuma abstenção, três votos contra e quarenta e oito votos a favor, delegando na Junta de Freguesia de Pindelo dos Milagres os poderes de administração dos baldios, assim como os poderes de usufruir dos seus rendimentos e de movimentar as contas bancárias que estão em nome da Comissão de Compartes ou Conselho Diretivo da Comissão de Compartes da Freguesia de Pindelo dos Milagres, incluindo as verbas à data aí depositadas, no respeito do n.º 1 do Artigo 22.º da Lei n.º 68/93, de 4 de setembro.” Perante uma tal “delegação”, poderia pensar-se que a junta de freguesia passou a exercer “competência própria” ou, ao menos, “competência partilhada”, para efeitos do estatuído no n.º 1 do artigo 3.º da Lei dos Baldios. Sem razão, porém. Competência própria para administrar o baldio já se viu que não é, uma vez que esta apenas existe no caso de inexistência de assembleia de compartes. Por outro lado, resulta do texto da lei que a competência partilhada é “com o Estado ou com as Regiões Autónomas”, o que exclui, desde logo, uma competência que ocorra por “delegação” dos compartes de um baldio. Mas, ainda que se admitisse que a competência parti- lhada o pudesse ser com quaisquer outras entidades, sempre se afigura necessário, para que se verifique uma situação de competência partilhada, que exista uma competência própria da Freguesia que, em determinada matéria, ela compartilhe com outra entidade. Ora não é isso que sucede em relação aos baldios quando exista assembleia de compartes. E daí que a conclusão deva ser a de que a questão se não integra nas competências da freguesia, quer exclusivas quer partilhadas, pelo que também aqui o referendo deve ser considerado ilegal, por violação do artigo 3.º, n.º 1, da LORL. 8.3. E nem se diga que, não havendo competência própria, a derivada de uma delegação genérica da ges- tão do baldio na Junta de Freguesia seria relevante para efeitos de determinar que a questão passaria a ser da competência da freguesia. É que, nesse caso, haveria que analisar qual a extensão dessa mesma competência quando o ato de delegação se limite – como sucedeu – a delegar “a gestão” do baldio e a transferir “poderes de usufruir” os rendimentos. E neste particular, a natureza própria dos baldios e a consequente estrutura da respetiva administração leva a concluir que a designada “delegação de poderes” não permite cobrir o ato que se pretende realizar e submeter a referendo (de acordo com a Ata da Assembleia de Freguesia na qual se deliberou submeter o arrendamento do baldio a referendo local, tal arrendamento destina-se à instalação de uma “fábrica de transformação de subprodutos de carne de origem animal”, “pelo período de cinquenta anos”). Um pri- meiro argumento pode retirar-se da análise das competências do conselho diretivo do baldio e da inserção sistemática da delegação de poderes. Na verdade, na Secção III da Lei dos Baldios, com a epígrafe Conselho Diretivo, contém-se a previsão das competências de tal órgão, aí se destacando, no que aos presentes autos interessa, a competência para exercer em geral todos os atos de administração ou coadministração do baldio – alínea j) do artigo 21.º E o facto de ser nesta mesma secção (artigos 22.º e 23.º) que a lei prevê a delegação de poderes, cimenta o entendimento de que os poderes de administração “delegáveis” são apenas os próprios do Conselho Diretivo. Desta forma, mantendo-se intocada a necessidade de a assembleia de compartes ser chamada a deliberar nas matérias da respetiva competência e sendo certo que não cabe nas competências do conselho diretivo a celebração de um arrendamento por prazo superior a 6 anos – admitindo-se que tal seja possível para baldios –, nunca a junta de freguesia poderia receber tais poderes por delegação. Por outro lado, nos termos do n.º 1 do artigo 12.º da Lei dos Baldios, os órgãos das comunidades locais deliberam, em regra, por maioria simples de votos dos membros presentes. Em certas matérias, porém, a lei exige uma maioria qualificada de dois terços desses membros: é o caso, entre outros, da deliberação da assembleia de compartes sobre a alienação ou a cessão de exploração de direitos sobre os baldios – n.º 1, alínea j) , e n.º 2 do artigo 15.º da Lei dos Baldios. Ao fazer depender a alienação ou oneração do baldio de
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