TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
472 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Artigo 269.º Atos a ordenar ou autorizar pelo juiz de instrução 1. Durante o inquérito, compete exclusivamente ao juiz de instrução ordenar ou autorizar: (…) c) buscas domiciliárias, nos termos e com os limites do artigo 177.º» 6. Face à enunciação da interpretação normativa, cuja constitucionalidade é questionada, conclui-se que o arco de disposições legais selecionado pelo recorrente é demasiado amplo, incluindo preceitos que, em rigor, não constituem suporte do critério normativo em apreciação. Acresce que, nas alegações, o recorrente utiliza, na sua argumentação, especificações que correspondem à sua interpretação subjetiva dos factos, sem projeção, de resto, na ratio decidendi da decisão recorrida – nome- adamente que os co-habitantes do domicílio “não são familiares entre si nem vivem de modo comunitário”, mas de forma “compartimentada” – pelo que convirá relembrar que a delimitação do objeto do recurso terá em consideração o enunciado formulado no requerimento de interposição respetivo, que aliás fixa tal objeto de forma definitiva. Relativamente ao arco de disposições legais escolhido, por conter o núcleo essencial de suporte do critério normativo, cuja constitucionalidade é questionada, considera-se cumprido, de forma suficiente, o respetivo ónus de especificação, apenas se procedendo, neste momento, a uma delimitação mais precisa, por forma a tornar mais claro o âmbito da questão sobre a qual o Tribunal se pronunciará. Assim, o critério normativo que será analisado corresponde à interpretação normativa, extraída da con- jugação dos artigos 174.º, n. os 2 e 3, 177.º, n.º 1 e 269.º, n.º 1, alínea c) , todos do Código de Processo Penal, segundo a qual a autorização judicial de busca domiciliária, em situações de partilha por diversos indivíduos de uma habitação, pode abarcar as divisões onde cada um dos indivíduos desenvolve a sua vida, ainda que não visado por tal diligência. 7. Antes de entrarmos na análise da concreta interpretação normativa identificada, torna-se necessária uma densificação conceitual da diligência processual problematizada. A busca, prevista no Código de Processo Penal, é uma diligência tendente à obtenção de objetos rela- cionados com um crime ou que possam servir de respetiva prova ou ainda à detenção de um indivíduo, fundamentando-se a sua realização na existência de indícios de que os mesmos se encontrem em lugar reser- vado ou não livremente acessível ao público. Estruturalmente, tal diligência processual encontra-se associada a uma entrada em espaço de acesso restrito ou vedado e a uma atividade direcionada à descoberta de algo – objetos ou indivíduo a deter – que se encontrará tendencialmente escondido ou dissimulado. Face ao objeto do presente recurso, centrar-nos-emos apenas na dimensão da busca que respeita à des- coberta ou apreensão de objetos. Relativamente a esta, a ênfase da diligência assenta particularmente na localização espacial de tais bens, em detrimento relativo do apuramento da respetiva titularidade subjetiva. Os indícios em que se baseia apontam para a existência de objetos relacionados com um crime em determinado lugar, ou para a ocultação daqueles objetos em determinado lugar. Porém, tal ênfase não pode fazer esquecer que o caráter intrusivo da busca – que abrangerá a abertura, nomeadamente com recurso a arrombamento, de portas, armários, gavetas; a visualização e o manuseamento de objetos de uso lícito, estranhos à investigação em curso – tem uma incidência virtualmente lesiva, de devassa, sobre as pessoas que ocupam o espaço que é alvo da busca. Tal intromissão acentua-se no caso das buscas domiciliárias, face ao caráter especialmente reservado desse espaço.
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