TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

456 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL não está amparada em nenhum dos cânones hermenêuticos em geral praticados, ou seja de uma questão de mera legalidade, cuja competência de controlo, no nosso sistema, escapa ao Tribunal Constitucional. Entendi, contudo, que a interpretação normativa sindicada, pelo seu conteúdo e não pela sua revelia à lei, não deixava de pôr em causa o direito à existência de um processo equitativo consagrado no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição. A expressão constitucional um processo equitativo é premeditadamente aberta, estando dotada de uma força expansiva que lhe permite alcançar aqueles casos, como o da presente interpretação normativa, que impõe a aplicação simultânea de diferentes regimes processuais, sem um qualquer fundamento legitimante, entre os processos executivos iniciados posteriormente a 1 de janeiro de 2008, além de, sem razão justifica- tiva, determinar a aplicação de um regime que pode ter vigorado em época bem distante daquela em que foram instauradas as ações executivas. O critério apontado pela interpretação sindicada revela-se de tal modo arbitrário e inadequado que não pode deixar de merecer a reprovação do imperativo constitucional do processo equitativo. – João Cura Mariano . DECLARAÇÃO DE VOTO Tendo embora votado a decisão de inconstitucionalidade da norma do artigo 11.º, n.º 1, do Decreto- -Lei n.º 303/2007, quando interpretada no sentido de que às ações executivas intentadas após o início da vigência daquele diploma e que tenham que correr por apenso à ação declarativa, não se aplica o regime de recursos instituído por este, divergi quanto à fundamentação, por ter tido dúvidas que fosse ainda controlo normativo aquele que se realiza no presente Acórdão, quando se considera que a interpretação normativa em causa, por ser surpreendente e imprevisível, viola o princípio da segurança jurídica e da proteção da con- fiança, ínsito no Estado de direito democrático (artigo 2.º da Constituição). Tê-la-ia, no entanto, considerado inconstitucional por violação do direito a um processo justo e equi- tativo (artigo 20.º, n.º 4, da Constituição): tal interpretação normativa, ao conduzir, sem razão justificativa bastante, à aplicação simultânea de diferentes regimes processuais para os processos executivos iniciados depois de 1 de janeiro de 2008, considerando pendente, no início da vigência da lei nova, um processo executivo ainda não instaurado, foge a uma conformação justa e adequada do processo, quando encarado no seu conjunto, para as situações que se lhe possam considerar-se subsumíveis. Uma tal solução não tem qualquer fundamento legitimante. Pelo contrário, como resulta claramente da descrição que acompanha a fundamentação do acórdão, a solução preconizada – cuja aplicação, aliás, em muito dependerá de fatores externos – contraria as linhas gerais de um processo que se possa ter como adequado e justo. – Catarina Sar- mento e Castro. Anotação: Os Acórdãos n. os 14/00, 275/02, 413/02, 429/10 e 398/11 estão publicados em Acórdãos, 46.º, 53.º, 54.º, 79.º e 82.º Vols., respetivamente.

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