TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
449 acórdão n.º 213/12 8. A interpretação do artigo 11.º, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 303/2007, feita pelo tribunal recorrido, viola tam- bém o princípio constitucional da igualdade na medida em que restringe a possibilidade de dois cidadãos terem o mesmo prazo de recurso (isto é, ser-lhes aplicável o mesmo regime de recursos) em casos idênticos submetidos a tribunal no contexto da mesma legislação. 9. Independentemente da correção da interpretação seguida pelo Supremo Tribunal de Justiça, certo é que inexiste qualquer fundamento sério, razoável e legítimo que possa justificar a diferenciação jurídica de situações idênticas. 10. Acresce que a interpretação seguida pelo Supremo Tribunal de Justiça prejudica a segurança jurídica, a qual deverá guiar e limitar eventuais diferenciações jurídicas entre situações idênticas, quando dotadas de fundamento legítimo. 11. Atendendo à ratio do artigo 11.º, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 303/2007 (evitar a aplicação de diferentes regimes de recursos no mesmo processo), é de concluir que esta não é compatível com a extensão do âmbito de aplicação daquela disposição a ações executivas instauradas após o início de vigência daquele diploma que corram por apenso a ação declarativa, uma vez que, estando em causa um novo processo, não haverá risco de aplicação de diferentes regimes de recursos no mesmo processo. 12. Pelo que, a ratio daquela norma não fundamenta a distinção entre situações idênticas levada a cabo pelo Supremo Tribunal de Justiça. 13. Do exposto decorre que a interpretação do artigo 11.º, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 303/2007, defendida no douto acórdão recorrido pelo Supremo Tribunal de Justiça viola o princípio da igualdade, na sua dimensão da proibição do arbítrio, ofendendo dessa forma o artigo 13.° da Constituição da República Portuguesa. 14. Assim, a norma constante do artigo 11.º, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 303/2007, interpretada no sentido de que às ações executivas intentadas após o início de vigência daquele diploma e que tenham de correr por apenso à ação declarativa não se aplica o novo regime de recursos instituído por aquele diploma, enquanto nas ações executi- vas que não tenham de correr por apenso se aplica o novo regime de recursos é, nessa interpretação, materialmente inconstitucional, por violação do artigo 13.° da Constituição da República Portuguesa. Nestes termos, e nos mais de direito aplicáveis, deverá julgar-se o presente recurso procedente e, consequente- mente, declarar-se inconstitucional a norma do artigo 11.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 303/2007, de 24 de agosto, na interpretação que dela é feita no douto acórdão recorrido, com as legais consequências. Justiça.» 2. O recorrido contra-alegou, concluindo o seguinte: «1. O recurso apresentado pela recorrente junto do tribunal recorrido viola o disposto nos artigo 8.º e 11.º (DL 303/2007, 24 de agosto), que determina que a nova lei entra em vigor no dia 1 de janeiro de 2008, apenas se aplica aos processos que deram entrada após 1 de janeiro de 2008, pelo que lhe deve ser negado conhecimento. 2. Ora, in casu , o processo declarativo deu entrada no Tribunal da Primeira Instância em 2007, muito embora o apenso executivo de cuja decisão foi interposto recurso para a Relação do Porto, seja posterior a essa data, mas há uma notória relação, de total dependência, entre o presente recurso e mesmo o anterior, e a decisão declarativa de 1.ª Instância e veja-se mesmo a relação umbilical que a recorrente faz no seu recurso com a decisão de 1.ª Instância, socorrendo-se desta de forma insistente, contínua e em total dependência desta. 3. O regime aplicável é o anterior Decreto-Lei 303/2007, pelo que a Apelada tinha 10 dias para primeiro inter- por o Recurso, e depois, se deferido, apresentar as motivações, sendo que, só deu entrada no dia 19 de janeiro de 2011, tendo sido o douto Acórdão notificado a 2 de dezembro de 2010, que a recorrente não observou. 4. De qualquer dos modos, a convivência transitória entre o atual e o anterior regime dos recursos em processo civil não belisca o princípio da igualdade. 5. O Tribunal Constitucional já por diversas vezes foi chamado a pronunciar-se sobre situações de «tratamento desigual» resultante da aplicação de leis no tempo, e a esse respeito tem reiteradamente afirmado que o princípio da igualdade não opera diacronicamente. Ou seja, o legislador não está, em regra, obrigado a manter as soluções
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