TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012

439 acórdão n.º 199/12 Daí que o Agente de execução não é na ação executiva uma primeira instância de decisão, nem a lei o tratou como tal, como diz a recorrente, nem tal se pode inferir de na alínea c) do n.º 1 do artigo 809.º do CPC o legis- lador ter atribuído competência ao Juiz da causa para julgar, sem possibilidade de recurso, as reclamações de atos e impugnações de decisões do agente de execução, pelo simples facto de “as decisões do Agente de execução” não terem natureza jurisdicional, ou seja, não lhe caber “dizer o direito”, função que apenas cabe ao Tribunal/Juiz no interesse e defesa do cidadão. A função decisória relativamente a determinados atos ou requerimentos das partes no processo executivo (e que podem ser objeto de reclamação ou impugnação para o Juiz da causa), sendo da competência do Agente de execução, não constituem verdadeiros julgamentos das questões cujo conhecimento lhes é submetido, pois não têm natureza jurisdicional. Diz a recorrente, que os Agentes de execução devem, também eles, em primeira linha garantir a legalidade e o direito, em estrito cumprimento da lei, assegurando os direitos de uns em face dos direitos e interesses de outros. Pois devem. Mas, esse é um dever de todo e qualquer agente que exerça uma função de Oficial Público, e não do Agente de execução em particular, que nada tem a ver com a função jurisdicional do Tribunal. Atrevemo-nos até a dizer, que esse é um dever de todas as entidades, públicas e privadas, e de todos os cidadãos que verdadeiramente exercem a cidadania. Em conclusão, a reforma da ação executiva de 2008 operada pelo Decreto-lei n.º 226/2008 de 20 de novem- bro, aprofundou uma desjurisdicionalização do processo executivo em relação à reforma da ação executiva de 2003, mas nem desjudicializou a ação executiva, nem cometeu qualquer função jurisdicional ao Agente de execução. Onde radica então in casu , no dizer da recorrente, a inconstitucionalidade da dita norma legal? Alega a recorrente, que tal norma – n.º 6 do artigo 808.º do CPC –, ao permitir que o exequente possa livre- mente substituir o Agente de execução, e face a todos os poderes/deveres processuais do Agente de execução já acima enunciados e tratados, tal substituição colide com a independência necessária à boa prática da gestão dos processos, já que os Agentes de execução devem ser independentes e imparciais pela aplicação daqueles normativos constitucionais que impõem essa mesma independência e imparcialidade aos Tribunais. Essa independência e imparcialidade fica em causa, no dizer da recorrente, porque ao poder substituir livre- mente o Agente de execução, o exequente passa a ter o mais completo e amplo poder sobre o processo, poder do qual o Agente de execução é obrigado a abdicar, por decair perante a mais elementar dependência – a económica –, já que é um profissional liberal (embora depositário de funções públicas), e que fiscal e comercialmente agem no mercado como verdadeiras empresas ou comerciantes, em concorrência aberta. Essa limitação, como qualquer outra, na independência ou imparcialidade dos Agentes de execução, ofende a garantia do due process, e com isso ofende virtualmente os direitos de todos os executados. Acrescenta que “... a imparcialidade e independência de quem tem a seu cargo a gestão do processo é cla- ramente condenada com a possibilidade constante daquela disposição do CPC, inviabilizando, em abstrato, o exercício de funções públicas com o necessário afastamento e serenidade, essenciais à boa tramitação processual e à garantia dos direitos de todas as partes envolvidas – partes processuais e terceiros intervenientes (fiel depositário, encarregados de venda, credores reclamantes, devedores do executado, etc… e por isso viola os normativos consti- tucionais que impõem a independência e imparcialidade dos Tribunais (englobando estes os Agentes de Execução, como vimos já…” Se assim fosse, como alega a recorrente, se os Agentes de execução, por razões de dependência económica decorrente do facto de poderem ser substituídos pelos exequentes, e para o não serem, perdessem a imparcialidade e independência a que estão vinculados na gestão do processo pela sua condição de Oficial Público, então bem poderíamos dizer que estávamos perante “razões de caráter” absolutamente incompatíveis com tais funções. Restar-lhes-ia abdicar de as exercer. Por outro lado, em parte, estaria explicado o público inêxito que com as ditas reformas tem sido a ação execu- tiva, “cancro” nos nossos dias e nos últimos anos da boa administração da justiça.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=