TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 83.º Volume \ 2012
433 acórdão n.º 176/12 pelo Decreto-Lei n.º 296-A/98, de 25 de setembro, alterado, à data, pelo Decreto-Lei n.º 90/2008, de 30 de maio). Antes estamos perante uma alteração “retrospetiva”, na medida em que a nova lei veio exigir o preen- chimento de condições anteriormente não exigidas, cuja verificação se afere por factos em parte já ocorridos (no caso, parte das provas de ingresso foram realizadas no ano letivo anterior à entrada em vigor da altera- ção). Tratando-se da formação sucessiva de requisitos do concurso de acesso, um deles reporta-se a um facto passado (os exames do 11.º ano de escolaridade), facto que, por aplicação das novas regras, ainda não em vigor no momento em que foi praticado, é, no presente, submetido a exigências restritivas da sua valência concursal. Daí a questão de constitucionalidade a decidir nos presentes autos, que se resume a saber se é compatível com o princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança, dedutível do artigo 2.º da Constituição, a alteração ao regime especial de acesso ao ensino superior dos atletas de alta competição constante do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 393-A/99, operada pelo Decreto-Lei n.º 272/2009, na parte em que passa a exigir aos estudantes abrangidos por este regime que «tenham obtido as classificações mínimas fixadas pelos esta- belecimentos de ensino superior para as provas de ingresso e para nota de candidatura no âmbito do regime geral de acesso» quando aplicável a casos, como o da recorrida, em que parte dessas provas de ingresso foi realizada antes da mencionada alteração legislativa. 8. Estando envolvida, como está, a proteção da confiança dos particulares relativamente ao Estado legislador, deparamo-nos com um confronto entre dois valores igualmente acolhidos na Constituição: por um lado, a proteção da confiança dos particulares em não verem frustradas expectativas legítimas quanto à manutenção de um determinado quadro legislativo; e, por outro, a exigência de que o legislador, demo- craticamente eleito, disponha de uma ampla margem de conformação (e revisibilidade) da ordem jurídica infraconstitucional, com vista à prossecução do interesse público a que está vinculado (neste sentido, vide Jorge Reis Novais, Os Princípios Constitucionais Estruturantes da República Portuguesa , Coimbra, 2004, pp. 263-264). A jurisprudência deste Tribunal Constitucional tem entendido que – para além das regras que estabe- lecem proibições expressas de retroatividade, quanto a leis restritivas de direitos, liberdades e garantias, leis penais e leis criadoras de impostos – a afetação de legítimas expectativas dos cidadãos é violadora do princípio da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático, quando seja de reputar “inadmissível e arbitrária”, devendo a “ideia geral de inadmissibilidade” ser aferida pelo recurso a dois critérios: (i) afetação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível quando constitua uma mutação da ordem jurí- dica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dela constantes não possam contar; e (ii) quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalentes (deve recorrer-se, aqui, ao princípio da proporcionalidade, explicitamente consagrado, a propósito dos direitos, liberdades e garantias, no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição desde a 1.ª revisão (cfr., entre outros, o Acórdão n.º 158/08, que retoma as formulações do Acórdão n.º 287/90). Estes apertados critérios foram estabelecidos para situações em que os cidadãos detinham apenas meras expectativas legítimas, como é o caso da aqui recorrida. Já vimos que a norma aqui sindicada constitucionalmente afeta desfavoravelmente as expectativas daqueles que, como a recorrente, frequentavam o 12.º ano de escolaridade à data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 272/2009 e eram titulares do estatuto de atleta de alta competição. Resta saber em que medida essas expectativas são dignas de tutela. Já foi acentuado que a revisibilidade das leis é inerente às mesmas e a matéria em causa – estabeleci- mento de um regime especialmente favorável para um determinado grupo de estudantes – insere-se na ampla margem de conformação do legislador ordinário. Acresce que as razões invocadas para a mencionada alteração legislativa não são constitucionalmente irre- levantes. O Decreto-Lei n.º 272/2009 veio estabelecer as medidas específicas de apoio ao desenvolvimento
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